Projeto que permite instalação de Centro de Reintegração da Apac no Município irá à votação

por Maíra Kiefer última modificação 15/03/2022 00h06
14/03/2022 – Em debate há pelo menos quatro anos, a instalação de um Centro de Reintegração Social administrado pela Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (Apac) pode se tornar viável em território hamburguense a partir da aprovação do Projeto de Lei nº 110/2021, de autoria de 13 parlamentares. A proposição abre uma exceção na Lei Municipal nº 2.761/2014, que proíbe a implantação de novos presídios ou similares no perímetro urbano de Novo Hamburgo. O aval para a apreciação em plenário foi dado pela Comissão de Constituição, Justiça e Redação (Cojur) na última semana, em reunião no Plenarinho. Durante o encontro, alguns proponentes do PL reforçaram os argumentos da impugnação ao parecer de inconstitucionalidade do colegiado, exarado em fevereiro, que corroborou entendimento da Procuradoria da Casa.
Projeto que permite instalação de Centro de Reintegração da Apac no Município irá à votação

Crédito: Maíra Kiefer/CMNH

A partir da defesa realizada na quarta-feira, 9, e reavaliação da Cojur quanto à possibilidade de arquivamento da matériaderam voto favorável ao prosseguimento do trâmite o presidente Gustavo Finck (PP) e o relator Darlan Oliveira (PDT), que compôs o grupo como membro ad hoc devido ao licenciamento de Fernando Lourenço (PDT). Nesta segunda-feira, 15, o conteúdo foi submetido à Comissão de Obras, Serviços Públicos e Mobilidade Urbana (Coosp), que adiou a análise para o dia 21 devido à ausência de Ito Luciano (PTB). A continuidade do rito para votação em sessão ordinária, ainda sem data definida, foi apoiada pelas Comissões de Segurança (Coseg), com o voto contrário do presidente Finck, adepto à ideia da revogação do regramento atual, e de Finanças (Cofin), com a aprovação de todos os integrantes.  

Defesa na Cojur 

A presidente da Apac NH, Lisandra Müller, foi enfática ao sinalizar o quanto é urgente a decisão da Casa Legislativa, por ser tema já em pauta na cidade desde 2018, e a Apac já estar constituída em Novo Hamburgo há três anos, mas sem a unidade para tornar possível o método no município. “Perdemos a cada dia a chance de recuperar vidas, restaurar famílias, de diminuir a violência na cidade. Por um lado ou por outro, a gente precisa resolver a questão para que possamos dar um passo à frente e aproveitar a posição favorável do governo do Estado que apoia as Apacs e garante o custeio dos presos”, considerou. 

“Nós não temos mais tempo para esperar. Temos decisões administrativas a serem tomadas, com base nesta decisão. O futuro da segurança pública, da parte mais importante que é o sistema carcerário, está em nossas mãos, em dizer se nós queremos permanecer com a estrutura corroída, falida, que está aí, ou se nós queremos, de fato, construir uma alternativa que não sejam esses presídios controlados por facções”, apontou o vereador Enio Brizola (PT), um dos autores da proposição em análise e da impugnação encaminhada ao colegiado.

Além do documento rebatendo a antijuridicidade, apontada pela Procuradoria e acolhida inicialmente pela Cojur, parte dos autores, acompanhada de apoiadores à proposta, reiterou que há entendimento de que a Lei Municipal nº 2.761/2014, que será alterada pelo PL nº 110/2021, não é inconstitucional. “Há interpretação, feita por também um órgão de bastante relevância, que é a nossa Procuradoria-geral de Justiça, dando conta da constitucionalidade do texto do município, dizendo que se trata de um regramento da organização local e que, então, não está tratando efetivamente de matéria prisional e, por consequência, viabiliza que o município assim o faça, e também possibilita ser apreciada a proposição sobre esse texto legal”, afirmou o juiz Carlos Fernando Noschang Júnior, titular da Vara de Execuções Criminais, presente à reunião na Câmara. Ele disse que o Judiciário se posiciona pelo acatamento de que se trata de um projeto constitucional ou, alternativamente, que se revogue a lei em vigor. 

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O vereador Enio Brizola (PT) informou que ao todo 10 parlamentares protocolaram a impugnação, na qual foi defendido que “os municípios estão autorizados a promover o adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano, quando prevalecer o interesse exclusivamente local”. Concluindo-se assim, conforme os argumentos dos autores expostos no documento, pela possibilidade de os municípios regulamentarem aspectos concernentes a localização dos estabelecimentos prisionais em seus territórios, sem que as normas configurem violação a competência legislativa concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal.

Além das ponderações sobre a questão legal e técnica, os proponentes reforçaram a importância da metodologia Apac, baseada na Lei de Execução Penal, a partir de um novo enfoque no cumprimento da pena, executando a liberdade progressiva, priorizando a reeducação do preso que preencher os requisitos preliminarmente estabelecidos.

Peço a sensibilidade dessa comissão para apreciar com esse olhar, com o olhar da recuperação dessas pessoas, que a gente possa deixar o condenado e recuperar o homem, trazê-lo ao nosso convívio, é isso que se quer”, declarou Brizola.

Carlos Eduardo Braun, presidente da Subseção Novo Hamburgo da OAB, acrescentou que a Apac apresenta um percentual de ressocialização infinitamente superior ao que se vivencia hoje no sistema prisional comum.

Raizer Ferreira (PSDB) mostrou-se favorável à continuidade do trâmite do PL nº 110/2021 por entender ser a alternativa que permitiria ressocialização eficiente, com o método Apac, sem abrir brecha para que unidades prisionais convencionais sejam permitidas em solo hamburguense, caso possível com a supressão da legislação vigente. “Nós, com a outra opção, que é da revogação da lei, abriríamos a condição para que qualquer tipo de presídio possa ser estabelecido na nossa cidade. Nós precisamos ter o sistema Apac em Novo Hamburgo. Conhecendo o método, como conheci em 2021, eu defendo que nós tenhamos essa oportunidade de julgar o mérito, e a comissão encaminhar para que o plenário possa decidir”, explicou.

Semilda – Tita (PSDB) reforçou a importância de os demais vereadores conhecerem a Apac, assim como ela, Brizola, Raizer e Lourdes Valim (Republicanos) fizeram. A gente já debateu tanto esse assunto e agora é a hora de dar um xeque-mate. Nós vamos evoluir muito em Novo Hamburgo com a Apac aqui. Na verdade, não é só o apenado que está doente, muitas vezes, por causa de drogadição e tudo que o levou a cometer delitos, a família também está”, afirmou a parlamentar. Um dos pontos positivos apontados por Tita é de a oportunidade de recuperação e tratamento ser oferecida dentro da área urbana, facilitando o acesso de familiares e voluntários. 

Votos

Ao expor seu entendimento de que os infratores podem ser recuperados, Darlan Oliveira (PDT) justificou seu voto favorável à continuidade do trâmite da matéria. “Meu voto é sim, porque eu acredito que deve ir a plenário para os vereadores debaterem o mérito do projeto.”

Finck explicou que descartou a possibilidade aventada de extinção da lei vigente, pois constatou haver restrição em termos da revogação total dessa legislação. “Eu vou acatar para que a gente possa debater. Fiquei chateado com as manobras para colocar em urgência. A Comissão de Constituição e Justiça tem que ser respeitada, não se pode passar qualquer tipo de projeto dentro dessa Casa. Mas pela relevância da pauta, pelo esforço dos vereadores, pelas conversas que tivemos aqui hoje, vou acatar a impugnação, e que a gente possa discutir no plenário o mais rápido possível”, finalizou, sob aplausos.

Apacs no Rio Grande do Sul

A cidade de Canoas foi a primeira a ter uma Apac constituída há quase 10 anos. Contudo, até hoje, o Centro de Reintegração Social da cidade continua em fase de implantação. Mesmo dando os passos iniciais há mais tempo, foi Porto Alegre que teve, em 2018, a primeira iniciativa em funcionamento no Estado. Com a unidade localizada no bairro Partenon, a experiência da Capital tem servido de modelo para outros municípios que buscam essa alternativa de recuperação de apenados. Em 2021, o então presidente do Legislativo hamburguense, Raizer Ferreira, e a vereadora Lourdes Valim seguiram os passos dos colegas de parlamento Semilda – Tita e Enio Brizola e conheceram o trabalho realizado em Porto Alegre. Assim como Canoas, Novo Hamburgo já tem sua Apac constituída, com fundação ocorrida em março de 2019, mas não instalada. Incluído no Programa RS Seguro, a intenção do governo estadual é de implantar o método até o final de 2022 em pelo menos cinco localidades, sendo Novo Hamburgo uma das cidades contempladas.

Outros projetos na pauta

Depois da deliberação sobre o PL nº 110/2021, a Cojur arquivou duas proposições do vereador Brizola: Projeto de Lei nº 2/2022, que autoriza o Executivo Municipal a repassar aos Agentes Comunitários de Saúde (ACSs) incentivo financeiro adicional, e Projeto de Lei nº 3/2022, que dispõe sobre a implantação de medidas de informação à gestante e parturiente sobre a Política Nacional de Atenção Obstétrica e Neonatal, visando a proteção destas contra a violência obstétrica no município. Ambas as matérias tiveram apontamento de antijuridicidade da Procuradoria da Casa. Após notificação do autor, não foram apresentadas impugnações.