Moção pede que Prefeitura reconsidere finalização de contrato com a Casa de Acolhimento Cecrife Querubim
Assinado em 2018, o contrato com a Aevas passou por sucessivas prorrogações desde 2019, mas o Executivo já anunciou que interromperá as renovações. Em abril, a Administração homologou novo chamamento público para a realização do serviço. O preço apresentado pela Aevas (quase R$ 76 mil mensais para o acolhimento de até 20 crianças e adolescentes) foi superado pela Fundação Cidade do Menor São João Bosco (R$ 64 mil).
Em nota, a Secretaria de Desenvolvimento Social (SDS) informa ter buscado a mantenedora da Cecrife Querubim para propor a renovação do termo pelo valor de R$ 64 mil mensais, o que teria sido recusado. A pasta garante que nenhum dos 19 jovens atendidos atualmente ficará desassistido. Os abrigados inclusive já estão em processo de transição para outros serviços. A situação da Cecrife Querubim foi tema de discussão durante a sessão da última segunda-feira.
“A Cecrife presta atendimento, na modalidade de abrigo institucional, acolhendo meninos e meninas que se encontram em situação de violação dos direitos básicos. O afastamento dessas crianças e adolescentes do convívio familiar pode causar danos emocionais importantes. Através do trabalho realizado na instituição, com o suporte de profissionais técnicos, esses jovens podem ressignificar essa situação, construindo novas referências e vínculos”, explica Felipe.
Voluntário da casa de acolhimento, Hoeslen Mauzer fez uso da tribuna na sessão de segunda e destacou a preocupação com o corte do vínculo já estabelecido entre as crianças e a Cecrife Querubim. “Além de questões de cunho financeiro, existem pontos tão relevantes quanto e que precisam ser considerados na construção e execução desses editais, que buscam a prestação de serviços para o atendimento de crianças e adolescentes que sofrem ameaça ou violação de direitos e precisam de proteção excepcional e provisória”, continua Felipe.
Além da prefeita Fátima Daudt, a Moção nº 46/2021 também será encaminhada ao secretário municipal de Desenvolvimento Social, Eliton Ávila.
Discussão da moção
Enio Brizola (PT) usou a tribuna para destacar que a moção fala de cidadania, proteção básica, rede de atenção e humanismo. “É uma entidade séria, que presta serviços há mais de 41 anos no município, articulada na sociedade regional e nacional. Visitamos as instalações da Cecrife na tarde de terça, com as vereadoras Lourdes e Tita, após o longo debate da sessão de segunda. Voltamos encantados com a atuação da entidade, mas com o compromisso de não deixar que esse trabalho de acolhimento feito com àquelas crianças seja encerrado. Tem bebês de berço, um com necessidades especiais e diversas estudando e na recreação. É uma entidade preparada para acolher essas crianças, muitas, literalmente, abandonadas”, disse o vereador.
Segundo Brizola, na Câmara os vereadores debatem todos os tipos de assunto: econômicos, ambientais, de infraestrutura, aprovamos ou não. “Mas esta é uma questão humanitária, em tempos não comuns, época de pandemia, em que houve aumento da miséria. Nós aprovamos um projeto do Executivo subsidiando o transporte coletivo, para ajudar a população, as empresas, mas, aqui, tratam-se de vidas. O que está sendo proposto pela Aevas é uma parte do custo que eles têm para manter o atendimento de qualidade. Outra parcela é subsidiada, também, por apoiadores, empresas e amigos da entidade. Peço a aprovação da moção, como nosso gesto de ajuda àquelas crianças que estão vivendo no lar”, defendeu.
Ito Luciano (PTB) cumprimentou Brizola pela explanação e adiantou voto favorável à moção.
Felipe Kuhn Braun destacou que é sabedor que o orçamento do município tem suas limitações, mas que ele é suficientemente grande em cidades como Novo Hamburgo para poder abranger esta causa. “Acompanhamos e sabemos o grande trabalho da Aevas e da Cecrife, independente de partidos e ideologias. Esse é o momento de juntos fazermos a defesa pelo social. Não é um gasto que o Executivo vai ter, mas um investimento nessas crianças. E isso se reverterá na relação com a sociedade no futuro”, afirmou.
Gustavo Finck (PP) disse se sentir contemplado pelas falas dos colegas Brizola e Felipe. “Falamos tanto e defendemos a não precarização dos serviços públicos. Agora, temos de lutar e fazer um esforço tremendo para dar um atendimento qualificado a essas crianças”, pontuou.
Semilda dos Santo – Tita (PSDB) disse que não está discutindo o trabalho desenvolvido pela Aevas/Cecrife, porque sabe que é de referência. Segundo a tucana, o debate é sobre que norte será dado àqueles seres humanos. “Talvez por falta de diálogo, chegamos nesta situação. Vamos começar a ter um olhar especial para esses seres que já tiveram tantas perdas. Foram tirados de seus lares, onde os pais brigavam, usam drogas e álcool, e essas profissionais são a referência que eles têm agora. Essas crianças e adolescentes não são sacos de batatas e, por isso, precisamos pedir que o Executivo retome essa conversa. Não acredito que seja o valor a mais cobrado pela Aevas que esteja travando o processo. No momento que se pensa em vida, não se pensa em preço. Eu não aceito isso”, salientou a parlamentar que já foi conselheira tutelar. Emocionada, Tita mencionou o fato de as crianças poderem assistir a uma TV, sentir o cheiro do pão saindo do forno. “Agora, elas sabem que, às 11h30min, a comida estará na mesa e que de tarde tem lanche. E as pessoas que trabalham lá tratam essas crianças como se fossem suas. Jamais vou deixar de lutar pelas vidas e melhorias em nossa sociedade”, afirmou a parlamentar.
Parabenizando os colegas que já haviam se pronunciado, Lourdes Valim contou que também foi ver de perto o trabalho desenvolvido pela entidade e mencionou o fato de terem sido recebidos com muito carinho. “O lugar é nota mil. Não estamos tratando de objetos, mas de seres humanos, pequenos e indefesos. Eu vi o aconchego daquela casa, a alegria das crianças. Faço aqui meu apelo verbal, pelo amor de Deus, pelo bem das crianças, não tirem elas de lá. Eu sou órfã, mas fui criada pela minha vô e chorava na porta de casa todos os dias esperando minha mãe voltar. Imagina aquelas crianças que não têm família. Temos de nos unir em prol delas”, disse.
Sergio Hanich (MDB) ficou comovido com o discurso da colega Tita e disse conhecer de perto o grande trabalho que ela desenvolveu como conselheira tutelar e, agora, como parlamentar. Ele ressaltou que a “dona” do contrato é a Aevas e não a Cecrife. “Não podemos ser demagogos. Vamos sentar as partes principais, Aevas, Executivo e Juiz, para que fique bem explicado para onde vão essas crianças, por que, como será feito. Esse é o encaminhamento que tenho para a pauta. Não é a moção e nem o discurso que vai resolver, mas sim chamar as partes responsáveis e, a partir daí, direcionar. Se não fosse uma grande instituição, a Aevas não teria 41 anos de atuação”, garantiu o vereador.
O presidente Raizer Ferreira (PSDB) também se disse impactado pelo discurso forte e sensível da vereadora Tita e de outros parlamentares. “Nos sentimos comovidos. Mas precisamos de uma ação, pois só palavras não vão resolver. Esse processo licitatório já acabou. Outro precisa ser aberto. Quero que vocês coloquem carinho nas minhas palavras. Eu também questionei a SDS, e a resposta foi de que outra empresa venceu a licitação, com um valor mais baixo, R$ 64 mil. Dentro do trâmite de contração, não há o que se discutir depois de lançados os valores. Vai haver outro edital? Me responderam que sim, e que a Aevas poderá se habilitar e voltar a prestar o serviço. Mas dentro deste edital, ganhou a empresa com menor preço. Não sou contrário ao acordo ou porque estou do lado do Executivo. Foi um processo licitatório e precisa ser obedecido”, explicou.
Líder do Governo na Câmara, Ricardo Ritter – Ica (PSDB) lembrou que os gestores são sensíveis à causa, mas destacou que todos são regidos por legislação federal. “Gostaria que essa moção seja endereçada também ao Ministério Público. A prefeita não tem nenhuma intenção de maltratar essas crianças e adolescentes. Elas terão um encaminhamento. Sei que é difícil. A gente é adulto e, mesmo assim, avesso à mudança. Mas temos que seguir as leis”, reiterou.
Darlan Oliveira (PDT) declarou apoio aos autores da moção e à vereadora Tita. “Vocês e as crianças podem contar com o meu trabalho”, resumiu.
Brizola lembrou ainda que o custo real da Aevas é de R$ 95 mil, não de R$ 75 mil por mês. “São 20 profissionais contratados em regime de CLT, um salário baixo, mas é pago em dia. Tem uma estrutura da Aevas por trás. Se outra empresa vai fazer por R$ 64 mil, que tipo de serviço vai ser prestado? O debate é pela qualidade”, disse. Neste sentido, o vereador propôs a realização de uma audiência pública para debater a questão de outras entidades que enfrentam situação semelhante.
Raizer disse que cabe aos vereadores fiscalizar o serviço realizado pela nova empresa e não desqualificá-lo.
Fernando Lourenço (PDT) afirmou que é preciso sentar e resolver a situação. “Quando vai sair um novo edital? Neste meio tempo, como vai ser? Os profissionais e a infraestrutura da Aevas, o que vai acontecer? Como vão ficar? Serão dispensados? As crianças vão se adaptar? Esse acordo precisa acontecer para ontem. O encontro com todos os envolvidos precisa ser logo. É um caso que precisa ser debatido”, concluiu.
O que é uma moção?
A Câmara se manifesta sobre determinados assuntos – aplaudindo ou repudiando ações, por exemplo – por meio de moções. Esses documentos são apreciados em votação única e, caso sejam aprovados, cópias são enviadas às pessoas envolvidas. Por exemplo, uma moção louvando a apresentação de determinado projeto no Senado pode ser enviada ao autor da proposição e ao presidente daquela casa legislativa.