Transformar Hospital Municipal em referência para atendimento oncológico pelo SUS é meta de entidades e Poder Público
“Ouvindo todas as partes, foi-nos dada uma luz. Temos um hospital 100% SUS, mas não é credenciado. Credenciar com urgência para SUS oncologia já devia ter sido feito se estava sendo visto esse problema”, declarou Regina sobre a possibilidade dada à entidade em reunião com o Executivo. Nesse encontro, houve uma sinalização de uma futura ampliação do Hospital Municipal para se adequar às condições exigidas. Ela acredita que poderiam ser parceiros nessa obra a Feevale, que já oferece curso de Medicina, e empresários dispostos a ajudar.
Leia mais:
– Câmara cria comissão para acompanhar situação do atendimento oncológico na cidade
Essa alternativa não seria viável a curto prazo. Segundo o ex-secretário municipal de Saúde Naasom Luciano, no cargo até o começo de abril, há muito que ser feito para deixar a estrutura apta a esse volume de atendimento, pois demanda leitos clínicos, bloco cirúrgico, entre outros.
“O nosso planejamento é trazer a oncologia para dentro do Hospital Municipal após a conclusão das obras que se iniciaram”, informou o ex-representante da pasta, que acompanhou o debate no Legislativo.
Ajustes e melhorias urgentes e, postergadas há algum tempo, estão ocorrendo somente agora, segundo Naasom. Com 75 anos de fundação, é a primeira vez que o telhado está sendo arrumado, e reformadas as quatro salas do bloco cirúrgico, atingidas pelo vendaval de 2014, assim como o anexo, programado em 2012, que teve seu custo mais que duplicado devido especialmente à pandemia.
Estampada nos jornais há alguns dias, a mudança impacta diretamente na vida de 943 pessoas de Novo Hamburgo, que buscam tratamento para algum tipo de câncer. Desse total, 500 pacientes são cadastrados na Liga, por receberem até dois salários-mínimos e necessitarem de ajuda para enfrentar a doença. Nesse universo de atendidos pela instituição sem fins lucrativos, estão homens e mulheres atingidos pela enfermidade em diferentes órgãos e graus.
As informações sobre a mudança para Taquara tornaram-se públicas no mês de abril. Contudo, a Secretaria Municipal da Saúde busca soluções para o impasse, pelo menos desde 2018, conforme relato do ex-secretário. Ele informou que diversas vezes a pasta buscou repactuação junto ao Ministério da Saúde, em Brasília, para reaportar recursos e zerar a demanda reprimida no Município, que chegou a 300 pessoas aguardando serem chamadas. Na ocasião, o valor alcançado foi apenas 30% do que seria necessário.
O ex-vereador Naasom pontuou que a pactuação de valores não depende só da boa vontade do Município. Os caminhos da solicitação para ampliação dos valores pagos é longo: Fórum Regional, Comissões Intergestores Bipartite (CIB) e Secretaria de Saúde do Estado. Para que o Ministério da Saúde avalie, precisa ter havido uma aprovação regional e estadual. Ele narrou que, nos últimos dois anos, mais de 10 pautas foram encaminhadas por Novo Hamburgo, e a nenhuma delas foi autorizado o prosseguimento pelo Estado.
No começo de sua fala, a presidente da Liga lamentou que o assunto tenha vindo à tona apenas nessa momento de ruptura, mas garantiu que a entidade não deixará de atender, mesmo que exclusivamente em sua sede na rua Tupi. “Ouvimos a direção do Hospital Regina, a prefeita, o secretário de Saúde, que há seis anos vinha sendo trazido esse problema, vinha sendo pedida uma repactuação maior. Ninguém poderia imaginar chegar a esse ponto, se tivéssemos nos mobilizado antes", lastimou a representante da entidade para um plenário lotado de voluntárias e simpatizantes da causa, a grande maioria vestindo a cor rosa, marca da entidade.
Segundo Naasom Luciano, o problema não foi informado com certa antecedência à comunidade em virtude de um compromisso assumido junto ao Ministério Público Federal, de só divulgar a situação quando houvesse uma instituição já habilitada para assumir os doentes oriundos do Hospital Regina. O ex-secretário informou que estava em tratativa a renovação do serviço em Novo Hamburgo, quando o MPF instaurou uma ação civil pública contra o Estado, o Ministério da Saúde, o Hospital Regina e os cinco municípios atendidos – Campo Bom, Dois Irmãos, Estância Velha, Ivoti e Novo Hamburgo. Ele esclareceu que a demanda reprimida, a ineficiência em atender no prazo de 60 dias e o represamento de exames e cirurgias motivaram o processo. Durante as audiências, por sugestão do Estado, ficou definido que as quatro cidades vizinhas seriam atendidas pelo hospital de Taquara e a fatia de recursos correspondente aos 172 pacientes provenientes desses locais, transferida à nova unidade de referência. Isso ocorreu depois de a instituição de saúde taquarense se comprometer em zerar a fila de primeiras consultas, assim como as de cirurgias, compromisso que vem sendo cumprido em sua totalidade no primeiro quesito e em andamento no segundo.
Pelo relato de Naasom, nesse novo cenário, o recurso restante, vinculado aos atendimentos exclusivamente de Novo Hamburgo, não era suficiente para manter o serviço em território hamburguense. “Nos reunimos com o Hospital Regina, então, que nesse momento disse o seguinte: ‘com o recurso que vai sobrar, a gente não consegue dar conta de atender os parâmetros de portaria, que são 62 novos acessos todos os meses, o número estipulado de exames de alta complexidade etc.’ Tá lá no processo uma notificação do Hospital Regina: nós não teremos condições e vamos pedir a desabilitação”, descreveu Naasom. Ele acrescentou que o aporte dos valores que deixaram de ser recebidos pela instituição de saúde hamburguense, em torno de R$ 300 mil mensais, tem sido garantido pelo Município.
O atual secretário municipal da Saúde, Marcelo Reidel, afirmou que, a partir do momento que o Hospital Regina perdeu os municípios das referências, deixou de ser atrativo o contrato. Ele reiterou que essa situação ocorreu em dezembro, e o pagamento está a pleno devido aos recursos complementares repassados pela administração hamburguense. Com a desistência da instituição de Novo Hamburgo em cumprir os atendimentos conforme os valores pactuados, externada no começo do ano em audiências, a opção possível foi buscar um outro local de referência. Nassom contou que as tratativas se iniciaram com o Hospital Conceição, que, em um momento avançado das negociações, revelou precisar de um prazo de pelo menos um ano para conseguir absorver a demanda devido à necessidade de obras, restando como opção também aos pacientes hamburguenses os serviços oferecidos em Taquara.
Para Reidel, o debate na Câmara é o momento para esclarecer um pouco o lado do Executivo. De acordo com ele, a administração municipal teve que fazer o melhor dentro das possibilidades. Sem alternativas a curto prazo, o transporte dos pacientes para Taquara será garantido, com vans que buscarão os enfermos em suas casas e os levarão ao atendimento. Com contrato emergencial de R$ 100 mil por mês, deverão ser garantidas 200 viagens. O atual titular da pasta declarou que o número não é fixo, sendo a principal meta atender a todos que precisarem se descolar à cidade vizinha. Ele frisou que se trata de um momento de transição, com mutirões previstos para equacionar possíveis problemas e dificuldades. Desde que teve início a migração, já há 17 novos casos. Outra questão trazida por ele, após questionamento de Brizola, foi que os cidadãos deverão ter acesso à medicação de uso contínuo aqui em Novo Hamburgo. Reidel afirmou que esse assunto está em negociação, estimando que 90% dos remédios possam ser alcançados aos enfermos aqui na cidade.
Reidel explanou que não faltaram esforços, inclusive, emendas parlamentares de políticos do município foram direcionadas para o Regina. Essa mesma preocupação não teria sido percebida, de acordo com ele, por parte daqueles representantes eleitos nas demais cidades vizinhas, que tinham Novo Hamburgo como referência na área de Oncologia pelo SUS. Entretanto, os valores beneficiavam a todos aqueles que recebiam atendimento na instituição hamburguense. Na sequência, o vereador Gustavo Finck (PP) falou que o deputado federal Danrlei (PSD) liberará emenda no valor de R$ 550 mil para ser usada no auxílio ao Município nesse caso específico.
Comissão especial e a mobilização da comunidade
O impacto gerado pela transferência e importância do debate levaram um número expressivo de pessoas à sede da Câmara nesta quarta. Conforme estimativa da direção do Legislativo, cerca de 250 cidadãos ingressaram no prédio e assistiram à sessão em várias dependências da Casa. O público acompanhou as falas no Plenário, com capacidade de 111 cadeiras, no plenarinho, no hall e em diversas salas com televisões. Em respeito às limitações exigidas no alvará do Plano de Prevenção e Proteção Contra Incêndios (PPCI), emitido pelo Corpo de Bombeiros, uma parte das voluntárias da Liga e interessados no assunto não puderam ingressar no prédio.
Para uma plateia atenta e à espera de alternativas, Enio Brizola (PT), presidente da comissão especial, expôs que o grupo de parlamentares elegeu como prioridade ouvir a Liga Feminina e na sequência a direção do Hospital Regina, que foi convidada a participar de reunião do colegiado na próxima sexta-feira, 29. Além de ter Brizola à frente dos trabalhos, o grupo conta como relator Raizer Ferreira (PSDB) e como secretária Semilda - Tita (PSDB).
“Vamos iniciar hoje aqui nessa Casa uma grande mobilização, uma mobilização pela vida, não estamos sozinhos e não podemos ficar sozinhos”, disse o presidente da Comissão Especial. Brizola lembrou que a região obteve conquistas importantes e históricas, tais como a Universidade Feevale, a Fundação Municipal de Saúde e a vinda do trem até Novo Hamburgo. Para o parlamentar, a cidade tem força política para reverter a situação. "Essa luta tem dia para iniciar. Quero propor que ninguém aceite que seja sacramentado o atendimento em Taquara", reforçou o parlamentar do PT.
O presidente da Comissão Especial avisou que está entre as ações programadas pelo colegiado a visita ao novo hospital. Em virtude de ser uma vistoria técnica, questionou se algum representante da equipe oncológica do Hospital Regina poderia acompanhar os vereadores quando for agendada essa externa.
Assim com Brizola, Raizer mostrou-se preocupado com a garantia dada pelo Estado de que os serviços seguirão com a mesma qualidade e reafirmou que o grupo deverá ir ao local para averiguar o caso. Por requerimento verbal, ele possibilitou que o ex-secretário Naasom Luciano subsidiasse vereadores e o público presente sobre a situação que culminou na transferência do atendimento para Taquara.
Além dos representantes da área da saúde, acompanharam a sessão o secretário da Fazenda, Gilberto dos Reis, o assessor jurídico especial José Cacio Bortolini, a advogada Maria Regina Abel, representando a Comissão de Direitos Humanos da OAB, e o cirurgião oncológico Carlos Antonello, responsável pela área no Hospital Regina.
Antonello lembrou que o transporte até a cidade vizinha, que fica a cerca de 40 quilômetros de distância, é um fator crítico, mas há mais questões envolvidas. Ele sinalizou que outra preocupação é saber para onde será levado o paciente que passar mal após retornar do tratamento quimioterápico, por exemplo. o profissional questionou se poderá ser atendido na UPA de Novo Hamburgo ou terá que retornar para Taquara. De acordo com o especialista, a estatística médica já mostra que a pessoa com câncer deve realizar o tratamento o mais próximo possível do seu município, e citou o caso de São Paulo, cidade que prevê até mesmo a importância de a pessoa ser atendida no próprio bairro ou próximo àquele que reside.
A respeito do Hospital Bom Jesus, o médico relatou ter sido convidado há quatro anos para realizar cirurgias oncológicas na instituição e, junto a um colega de profissão, ter constatado, naquele momento, não haver condições para procedimentos desse porte.
Após o relato de Antonello sobre a situação do passado, o parlamentar Gustavo Finck (PP) mostrou-se preocupado devido ao fato de haver pendência de 57 cirurgias de cidadãos de Novo Hamburgo, de acordo com dados da diretora executiva do Hospital Regina, Gisele Albaneo. Todavia, Naasom salientou que após o a Associação Hospitalar Vila Nova assumir a administração do local, reformas e melhorias foram implementadas, o que levou a instituição de Taquara a receber o credenciamento federal. Para obtê-lo, o ex-secretário informou ser necessário passar por vistorias realizadas pelo Ministério da Saúde, presumindo-se que está habilitado para cumprir o contrato .
A preocupação do Parlamento com o tema motivou todos os parlamentares a assinar a criação da comissão especial para buscar alternativas para o impasse. Boa parte deles se pronunciou nesta primeira discussão pública da situação que afetará os pacientes com câncer que dependem do SUS para conseguir atendimento. Ito Luciano (PTB), Fernando Lourenço (Avante), Lourdes Valim (Republicanos), Giovani Caju (PP) e Inspetor Luz (MDB) fizeram uma série de questionamentos sobre o tema e externaram suas preocupações sobre os pacientes que terão se deslocar por quase uma hora para receber a atenção adequada.
Assista às falas na íntegra no vídeo abaixo: