Vereadores, Executivo, Judiciário e Conselho Tutelar devem debater Programa de Guarda Subsidiada em Famílias Acolhedoras
O secretário municipal de Desenvolvimento Social, Roberto Daniel Bota, informou que a iniciativa, entre outras questões, visa a oferecer um local que propicie um ambiente de maior atenção, especialmente às crianças de 0 a 3 anos. Conforme a psicóloga Denise Sardi, que deverá atuar no programa, diversos estudos apontam os reflexos positivos resultantes da atenção e dos cuidados especiais a bebês. Ela apontou ainda que o Brasil firmou compromisso junto à Organização das Nações Unidas (ONU), em 2007, de desativação de grandes instituições de acolhimento, em uma estratégia de desinstitucionalização. “Para tal, os Estados deverão estabelecer parâmetros de atendimento para garantir sua qualidade e condições adequadas ao desenvolvimento da criança, como, por exemplo, atenção individualizada e em pequenos grupos, devendo avaliar tais instituições por esses parâmetros”, aponta o documento elaborado há 11 anos.
Em relação à realidade de Novo Hamburgo, as conselheiras tutelares Madalena Soares, da 1° região, e Roberta Cornelly, da 2° região, revelaram não serem contrárias ao PL n° 63/2018. Contudo, reforçaram apenas terem algumas dúvidas referentes ao trabalho que será realizado junto à família de origem, à avaliação das famílias acolhedoras, ao tipo de assistência a ser prestada, à segurança e proteção das crianças, entre outras. “Na prática, estamos na linha de frente”, disse Roberta sobre as inúmeras situações vivenciadas no dia a dia do Conselho Tutelar.
Anete Cunha, gerente da Proteção Social Especial de Alta Complexidade, informou que o projeto técnico está em fase de elaboração, sendo baseado em iniciativas adotadas em outros municípios. A expectativa é de que, em caso de aprovação no Legislativo, o programa inicie efetivamente suas ações no mês de março, em virtude da divulgação e da avaliação das famílias selecionadas para acolher as crianças e adolescentes. Sardi disse que programas semelhantes foram implantados em Santo Ângelo (há 4 anos), Pelotas (2 anos) e Cascavel (10 anos). Daniel esclareceu que a previsão é de que 15 crianças sejam atendidas pelo projeto, com duração de um ano e meio a dois anos. Anete acrescentou que a iniciativa contará com um profissional de assistência social e um psicólogo, envolvendo reuniões mensais com as famílias.
Também participaram as subprocuradoras do Município Carolina Lampert e Adriana Selzer Ninomiya. Elas reforçaram que, embora o projeto não contenha todos os detalhes, há legislação que trata do tema em âmbito estadual e federal. Da Câmara Municipal, estavam presentes a procuradora-geral, Veridiana Fumegalli Paiva, e o diretor legislativo, Alexandre Hendler. Eles externaram as preocupações levantadas nas comissões da Casa.
Tramitação do PL n° 63/2018
A Comissão de Constituição, Justiça e Redação (Cojur) reuniu-se no final da mesma tarde para reexaminar a proposta. Em agosto, o grupo parlamentar, composto pela presidente Patricia Beck (PPS), o relator Raul Cassel (MDB) e o secretário Cristiano Coller (Rede), havia identificado antijuridicidade na matéria, por estar em desacordo com a Lei de Responsabilidade Fiscal. O principal apontamento era quanto à ausência de estimativa de impacto orçamentário, obrigatória para ações governamentais criadas que gerem aumento de despesa.
Em resposta à notificação encaminhada pela Cojur, a Prefeitura manifestou que a proposta acarreta, na verdade, redução de gastos. Conforme o documento, vagas em entidades acolhedoras são bancadas por valores mensais que variam entre R$ 2 mil e R$ 3,5 mil por criança. Como o projeto prevê o aporte de um salário-mínimo mensal por jovem acolhido – em 2018, R$ 954,00 –, a medida geraria diminuição da despesa estimada. Ainda assim, a Prefeitura remeteu à Câmara mensagem retificativa à matéria, suprimindo e alterando alguns dispositivos a partir de um novo entendimento jurídico sobre o texto.
A fim de aprofundar a análise sobre essas modificações, a presidente da Cojur, Patricia Beck, pediu o adiamento da apreciação do projeto de lei em 15 dias. O requerimento foi acatado por seus colegas. Já o relator Raul Cassel sugeriu que a comissão convocasse, para a primeira reunião após o encerramento do prazo solicitado pela vereadora, representantes do Executivo e do Conselho Tutelar para que a proposta possa ser melhor debatida e tenha sua redação aperfeiçoada. O pedido também foi aprovado.
Conheça o PL n° 63
O objetivo é garantir amparo e proporcionar meios de readaptação ao convívio em sociedade após casos de abandono, negligência, falecimento, ameaça e violação de direitos por parte de seus pais ou responsável, suspensão ou destituição de guarda, tutela e poder familiar ou ainda de afastamento cautelar. Para isso, os jovens seriam vinculados a famílias acolhedoras, cadastradas e capacitadas pela Secretaria de Desenvolvimento Social (SDS), com possibilidades futuras de reintegração a suas famílias ou adoção.
O programa mantém como metas, inclusive, a preservação de vínculos e o apoio ao retorno à família de origem – exceto em casos de determinação judicial em contrário –, além de oportunizar um ambiente sadio de convivência, atendimento médico-odontológico e frequência à escola e profissionalização. As famílias acolhedoras deverão residir em Novo Hamburgo ou cidades vizinhas há, pelo menos, dois anos, terem idades entre 20 e 55 anos, apresentarem idoneidade moral e não responderem a processo judicial.
A seleção e capacitação ficará a cargo da Gerência de Proteção Social Especial de Alta Complexidade, bem como da equipe técnica do programa, que também efetuarão o encaminhamento da criança ou adolescente e o acompanhamento sistemático das famílias acolhedoras e de origem. O cadastramento prévio, realizado junto à Gerência de Proteção Social, será dispensado apenas para a família extensa do jovem acolhido – o que não a exclui, contudo, das demais etapas do processo de guarda subsidiada.
A seleção dependerá de avaliação psicossocial anual pela equipe interdisciplinar da Vara da Infância e Juventude de Novo Hamburgo, ou de instituição credenciada, e levará em conta o local de moradia, o espaço físico, o ambiente familiar, a motivação e o preparo para o acolhimento desses jovens. O estudo envolverá todos os membros da família, sendo realizadas visitas domiciliares, entrevistas, contatos colaterais, atividades grupais e observação das relações. A emissão de parecer psicossocial favorável será requisito para a assinatura do termo de adesão ao programa.
Auxílio financeiro
O acompanhamento dos familiares cadastrados ocorrerá por meio de orientação direta, participação obrigatória em encontros de estudo, troca de experiências, cursos e eventos de formação, bem como visitas periódicas da equipe técnica do programa. A família acolhedora, que assinará termo de guarda, ficará responsável pela assistência material, moral e educacional dos jovens, conforme preconiza o Estatuto da Criança e do Adolescente. Será recebida apenas uma criança por vez, exceto quando se tratar de um grupo de irmãos.
Além do suporte técnico, cada família receberá um salário-mínimo mensal por jovem acolhido – até o teto de três salários. Em caso de pessoa com deficiência ou demanda específica de saúde, o valor poderá ser acrescido em uma terça parte. Os repasses terão como fontes dotações orçamentárias da própria SDS. O programa será fiscalizado tanto pelo Conselho Tutelar quanto pelo Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA), onde, se aprovado e sancionado o PL nº 63/2018, será registrado, dentro de 30 dias, projeto regulamentando a nova lei.