Vereadores aprovam homenagem e Vó Nair deve dar nome à área que recebe o 3º BPM

por Jaime Freitas última modificação 31/05/2021 22h19
31/05/2021 – Símbolo da negritude hamburguense, a benzedeira Nair Leopoldina de Oliveira, carinhosamente conhecida como Vó Nair, deve dar nome ao espaço público que atualmente sedia a estrutura do 3º Batalhão de Polícia Militar (BPM), no bairro Rondônia. A homenagem, sugerida pelo presidente da Câmara, Raizer Ferreira (PSDB), foi aprovada por unanimidade em primeira votação na noite desta segunda-feira, 31. Vó Nair faleceu em maio de 2019 por insuficiência cardíaca e renal. Ela viveu até os 101 anos de idade.
Vereadores aprovam homenagem e Vó Nair deve dar nome à área que recebe o 3º BPM

Foto: Maíra Kiefer/CMNH

Nascida em 21 de março de 1918, na região conhecida hoje como o bairro Hamburgo Velho, Nair começou a trabalhar cedo. Já aos 6 anos, ajudava sua mãe, de origem escravizada, lavando roupas e cuidando de crianças mais novas que ela. Aos 12, mudou-se para Porto Alegre, onde trabalhou em uma chácara e posteriormente como empregada doméstica na residência do deputado Raul Bittencourt, cuja família acompanhou ao Rio de Janeiro por um período.

De volta a Novo Hamburgo, Nair desempenhou diferentes funções, atuando como cozinheira, lavadeira, passadeira e ama de leite. Ficou mais conhecida, porém, no ofício de benzedeira, dom herdado de sua mãe, Dona Sara. Carismática, Vó Nair tornou-se figura muito querida pela comunidade hamburguense. Em 2017, foi homenageada Mulher Cidadã de Novo Hamburgo, em condecoração concedida pela Câmara. Nair deixou duas filhas, seis netos e cinco bisnetos.

"Eu quero aqui ressaltar a importância de lembrarmos das pessoas que marcaram nossa cidade, a nossa sociedade, por meio de suas ações, e a Vó Nair era uma dessas pessoas, que era querida por todos", disse Raizer.

Na justificativa do projeto, o autor aponta que, nas idas e vindas das memórias sobre o trabalho das mulheres negras no interior das elites brancas locais, Vó Nair pensava sobre o processo de passagem da sua condição de escrava de estimação, ocorrida na infância, para a sua condição de trabalhadora livre, já na fase adulta, quando ela passou a desempenhar as funções de cozinheira, lavadeira, passadeira, além de ama de leite. "Por um lado, os relatos sobre as formas de trabalho que ela desempenhava no âmbito das principais famílias alemãs do Vale do Sinos nos permitem compreender como o trabalho agregado e as afiliações acabaram por preservar, no interior da cultura germânica da região, os privilégios que conformavam a antiga sociedade escravocrata e patriarcal gaúcha. Contrastando com a dimensão do trabalho livremente vendido no mercado, as lembranças de Vó Nair nos sugerem uma vida de cativeiro *(Souza Martins, 1979), uma vez que ao longo de seus 101 anos, sua vida esteve de certa forma aprisionada ao monopólio das vontades das famílias abastadas do Vale do Sinos, seguindo uma linhagem de vida dedicada aos outros, que foi inaugurada por sua avó e mãe no interior da comunidade alemã de Novo Hamburgo".

"A Vó Nair, como era conhecida por grande parte de nós, hamburguenses, era realmente uma pessoa muito especial e auxiliava muita gente. Eu tive a felicidade de conhecê-la. Em 2017, tive o privilégio de homenageá-la com o título de 'Mulher Cidadã', sendo um momento muito bonito, um momento ímpar, que ficará gravado na nossa memória", disse o vereador Felipe Kuhn Braun (PP).

Apesar da aprovação unânime, o Projeto de Lei nº 43/2021 deve passar por votação final na sessão plenária desta quarta-feira, 2 de junho.

 

A aprovação em primeiro turno

Na Câmara de Novo Hamburgo, os projetos são sempre apreciados em plenário duas vezes. Um dos objetivos é tornar o processo (que se inicia com a leitura da proposta no Expediente, quando começa sua tramitação) ainda mais transparente. O resultado que vale de fato é o da segunda votação, geralmente realizada na sessão seguinte. Assim, um projeto pode ser aprovado em primeiro turno e rejeitado em segundo – ou vice-versa.


Referências: 

Trabalho negro, memória negra no Vale do Sinos (RS): narrativa etnobiográfica de Vó Nair.
I Universidade Feevale – Brasil, II Universidade Federal do Rio Grande do Sul – Brasil
Margarete Fagundes Nunes I; Magna Lima Magalhães I; Ana Luiza Carvalho da Rocha II