Palestrante destaca a importância da participação feminina na política e nas instituições
Para ilustrar sua fala, Débora iniciou sua palestra abordando um equipamento essencial para a segurança veicular, o airbag, item obrigatório em todos os carros novos vendidos nos Estados Unidos desde 1998. Contudo, após sua implantação, identificou-se que mulheres e crianças eram 50% mais suscetíveis a mortes e lesões graves. Após investigações, verificou-se que o time de engenheiros homens que desenhou o airbag utilizou como padrão suas alturas e pesos, colocando em risco mulheres e crianças.
“O mesmo raciocínio aplica-se à política. A inclusão de mais mulheres é uma questão não só de justiça, mas de interesse público. Na tecnologia e na política, a sub-representação feminina afeta negativamente o desenvolvimento e avanço da sociedade, que perde por não se valer de um aporte vital e significativo de contribuições”, disse Débora. Conforme aponta a palestrante, apesar das mulheres comporem a maioria do eleitorado brasileiro, e de uma legislação de cota de 30% para candidatas femininas, até 2018 as mulheres nunca haviam ultrapassado a marca de 10% na Câmara dos Deputados. Naquele ano, a eleição de 77 parlamentares elevou a 15% a participação feminina. “Em 2022, a situação melhorou um pouco. Temos hoje 91 mulheres na bancada federal da Câmara, sendo seis deputadas gaúchas. Na Assembleia Legislativa, temos 11 deputadas estaduais. Ambos números representam cerca de 20%, aquém da cota de 30%, a qual deveria ser o mínimo aceito por nossa sociedade – o ideal seria 50%”, destacou.
Ainda com a pequena melhora, em um ranking mundial que mede a presença feminina nos parlamentos, o Brasil encontra-se na posição 130 entre 193 países. O ranking é liderado por Ruanda, com 61% de mulheres legisladoras, em razão de um contexto histórico e de um sistema de reserva de assentos. Outras nações do topo são Nova Zelândia, México, Islândia, Suécia e Noruega. O Brasil classifica-se atrás de países como Iraque, Afeganistão e Arábia Saudita. Entre os 33 países latino-americanos e caribenhos, o Brasil está na posição 31, à frente apenas de Belize e Haiti.
Débora do Carmo também falou sobre o Relatório Mundial sobre Desigualdade de Gênero, elaborado e publicado anualmente pelo Fórum Econômico Mundial. O documento avalia e classifica as nações sob quatro dimensões: empoderamento político feminino; participação e oportunidades econômicas; saúde e sobrevivência; e educação.
Em 2021, o relatório apontou que a desigualdade de gênero na política permanece a maior das quatro lacunas rastreadas, e vem se agravando em relação aos anos anteriores. “Nos 156 países avaliados, as mulheres representam apenas 26,1% de cerca de 35.500 assentos em parlamentos, e apenas 22,6% de mais de 3.400 ministérios em todo o mundo. Segundo o estudo, no atual ritmo de progresso, estima-se que serão necessários 145,5 anos para atingir paridade de gênero na política. E a falta da atribuição de poder político às mulheres é o quesito que mais atrapalha o desempenho global do Brasil.”
Sabe-se que a violência contra os direitos políticos das mulheres é reconhecida como um dos principais obstáculos à plena participação feminina na política, pois, além da violação em si, representa um risco para suas vidas. A ONU Mulheres inclui a violência política como temática prioritária a ser enfrentada globalmente.
No mesmo sentido, o Relatório Final da Missão de Observação Eleitoral da Organização dos Estados Americanos (OEA), que acompanhou as eleições municipais brasileiras de 2020, registrou preocupação com o clima de violência política dirigida, em particular, contra as mulheres e suas famílias. O estudo evidenciou um aumento do discurso agressivo e discriminatório nas campanhas eleitorais, especialmente por meio do uso da violência física e digital, sobretudo em redes sociais, com o uso de mensagens falsas. Por fim, recomendou ao Brasil revisar e avançar o campo de ações jurídicas imediatas para proteger a vida e a integridade de mulheres candidatas e outros grupos vulneráveis. Segundo o relatório, é necessário “legislar para prevenir, punir e erradicar a violência relacionada com a participação política”.
Em agosto de 2021, foi aprovada no Brasil a Lei nº 14.192/2021, que estabelece normas para prevenir, reprimir e combater a violência política contra a mulher, alterando as Leis nº 4.737/1965 (Código Eleitoral), 9.096/1995 (Lei dos Partidos Políticos) e 9.504/1997 (Lei das Eleições), representando importante marco legislativo nas eleições de 2022, as primeiras a contemplarem tal proteção jurídica às candidatas e detentoras de mandato eletivo. A lei define em seu artigo 3º a violência política contra a mulher como toda ação, conduta ou omissão com a finalidade de impedir, obstaculizar ou restringir os direitos políticos da mulher. A redação do parágrafo único integra o conceito ao descrever igualmente como atos de violência política contra a mulher qualquer distinção, exclusão ou restrição no reconhecimento, gozo ou exercício de seus direitos e de suas liberdades políticas fundamentais em virtude do sexo.
Ao final de sua palestra, Débora leu uma citação. “Fomos tão condicionados a pensar no poder como masculino que uma mulher poderosa é considerada uma aberração. E por isso ela é policiada. No caso de mulheres poderosas, perguntamos: ela tem humildade? Sorri? Mostra gratidão? Tem um lado doméstico? São perguntas que não fazemos a homens poderosos, o que demonstra que nosso desconforto não é com o poder em sim, mas com a mulher. Julgamos as poderosas com mais rigor do que os poderosos”, texto de Chimamanda Ngozi Adichie, no livro “Como educar crianças feministas”.
Representando a prefeita Fátima Daudt, o vice-prefeito Márcio Lüders ocupou a tribuna para enaltecer a importância da mulher na sociedade e na política. “A grande participação das mulheres no secretariado do Município demonstra que, para ocupar espaços na Administração Pública, é preciso competência; não é uma questão de gênero”, finalizou.
Uma prefeita e 11 vereadoras
Perto de completar 96 anos de sua emancipação, Novo Hamburgo vive, desde 2017, a primeira gestão de uma prefeita mulher. Se Fátima Daudt foi pioneira no Executivo, na Câmara esse posto coube a Sandra Hack, vereadora entre os anos de 1968 e 1972. Passadas cinco décadas e meia, apenas dez mulheres conseguiram repetir o feito como titulares: Maria Paula Biondi, Marlene Plangg (primeira presidente mulher da Câmara), Marion Rovena Brochado, Celina Grezzana, Maria Lorena Mayer, Anita Lucas de Oliveira, Carmen Ries, Patricia Beck e as atuais parlamentares Tita e Lourdes Valim.
A pedido de Darlan Oliveira (PDT), sua colega pedetista Gabriela Ortiz, vereadora em Sapucaia do Sul, ocupou a tribuna após as votações da ordem do dia ainda em alusão ao Dia Internacional da Mulher. Nomeando-se feminista, Gabriela é estudante de Políticas Públicas pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Foi a sétima mulher eleita vereadora no município, com 1.512 votos, e consagrada como a mais jovem da história de Sapucaia do Sul. "Desde muito pequena vivi a política em casa. Fui adotada pelos meus pais aos 18 dias de vida e, desde então, trilhei um caminho de luta e militância junto a eles e alguns familiares. Filha de pai negro e mãe branca, convivo com a diversidade étnico-racial, com a diversidade de pensamentos, de crenças religiosas e, principalmente, de gênero. Convivo com mulheres muito fortes que impulsionaram muito do que acredito hoje, que a representatividade das mulheres precisa ser alcançada em todos os espaços de poder e que não devemos nos limitar por aquilo que a sociedade nos impõe", relatou a parlamentar sapucaiense.
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Mês da Mulher
A atividade em plenário integrou a programação do Mês da Mulher de Novo Hamburgo, idealizada pela Procuradoria da Mulher da Câmara em parceria com outras entidades ligadas ao tema. Confira os próximos eventos: