Moção sugere uso de terreno no bairro Santo Afonso para reassentamento de famílias afetadas pelas obras do dique

por Luís Francisco Caselani última modificação 15/04/2025 15h35
14/04/2025 – A remoção das famílias no entorno do dique do Rio dos Sinos, no bairro Santo Afonso, voltou à pauta da Câmara de Novo Hamburgo na noite desta segunda-feira, 14. Embora reconheçam a necessidade da medida para a execução das obras de recuperação da estrutura de contenção, os vereadores reiteram a importância da garantia de moradias dignas aos cidadãos afetados. Uma das alternativas propostas, aprovada por unanimidade sob forma de moção de apelo, seria a utilização de um terreno em frente à estação Santo Afonso para a construção das novas unidades habitacionais. O documento, elaborado por Cristiano Coller (PP), será enviado para análise do Executivo.
Moção sugere uso de terreno no bairro Santo Afonso para reassentamento de famílias afetadas pelas obras do dique

Crédito: Maíra Kiefer/CMNH

Como a área na rua Celestino Killing é de propriedade da Trensurb, a Moção nº 10/2025 pede à Prefeitura que inicie articulações junto ao Governo Federal. “Atualmente, 58 famílias residem em áreas de risco e sabemos que precisam ser realocadas, para garantir sua segurança diante das vulnerabilidades agravadas pelos eventos climáticos extremos que atingiram nossa cidade. As famílias compreendem a necessidade do deslocamento e têm demonstrado disposição em colaborar com o processo de transição. No entanto, é fundamental que isso ocorra de forma respeitosa, sensível e, acima de tudo, humana”, destaca Coller.

Ao longo do texto, o vereador elenca os benefícios do aproveitamento do terreno para os cidadãos afetados, não apenas por questões de mobilidade urbana, mas também pela permanência no bairro onde moram há décadas. “Essa escolha contribuiria para preservar vínculos sociais, familiares e comunitários importantes, reduzindo o impacto emocional da mudança e facilitando a adaptação à nova realidade. Manter as famílias na mesma região é essencial para garantir a continuidade da vida escolar das crianças, o acesso a serviços públicos já conhecidos, bem como a manutenção dos empregos, pequenos comércios e redes de apoio construídas ao longo dos anos. A realocação para áreas distantes comprometeria seriamente essas estruturas, impondo ainda mais dificuldades a pessoas que já foram duramente atingidas por uma tragédia”, ressalta o autor.

O terreno da Trensurb, por sua localização estratégica e viabilidade urbana, apresenta-se como uma alternativa concreta, justa e eficaz para acolher essas famílias com dignidade, respeito e visão social. Esse projeto habitacional representa muito mais do que a construção de casas: trata-se da reconstrução de vidas”, prossegue o documento. “Ouvimos rumores de que virá um projeto de lei para a desapropriação de uma área no bairro Canudos, onde essas famílias seriam alocadas. Acho que, quando chegar aqui, precisamos conversar e estudar bem. Não é justo que essas pessoas, que viveram sua vida toda no Santo Afonso, serem mandadas para outro bairro”, comentou Coller pouco antes da votação.

Presidente da Comissão de Obras da Câmara, Joelson de Araújo (Republicanos) tem acompanhado de perto o drama das famílias que moram próximo ao dique. “Precisamos realocá-las em um espaço adequado, com menor risco e que não traga tantos impactos para suas vidas. Elas merecem dignidade”, frisou. Presidente da Comissão de Direitos Humanos, Professora Luciana Martins (PT) sublinhou trecho da Constituição para defender o pleito dos moradores. Quando falamos sobre direito a moradia, estamos falando de habitação adequada, segura e digna, com segurança na posse, acessibilidade, localização e adequação cultural. Mas estamos desde fevereiro deixando toda uma comunidade desesperançosa. Não estamos falando de ninguém que chegou ontem à rua Eldorado. São pessoas que moram lá há 35 anos”, ilustrou.

Mobilização

Além da aprovação de todos os vereadores, a moção levou a assinatura de Daia Hanich (MDB), Deza Guerreiro (PP), Eliton Ávila (Podemos), Enio Brizola (PT), Felipe Kuhn Braun (PSDB), Giovani Caju (PP), Ico Heming (Podemos), Ito Luciano (Podemos), Joelson de Araújo, Juliano Souto (PL), Professora Luciana Martins e Ricardo Ritter – Ica (MDB). O apoio maciço dos parlamentares levou Brizola a sugerir a Cristiano Coller que organize uma reunião com a direção da Trensurb para a entrega do documento em mãos.

A quebra de vínculos é muito grande nessas transferências, sem contar que não há infraestrutura preparada anteriormente para receber essas famílias. Unidades de saúde, escola, transporte coletivo, tudo tem que ser ampliado. Temos a experiência do Residencial Novo Hamburgo, no Boa Saúde, para onde foram muitas famílias do Kephas e do Santo Afonso. As pessoas sofreram com as distâncias. Boa parte das famílias retornou a seus lugares de origem. Não podemos repetir os mesmos erros”, pontuou Brizola, em discurso apoiado por Eliton Ávila. Verificamos que muitas casas sequer estão ocupadas por causa de problemas de violência. A construção do Residencial Novo Hamburgo foi uma iniciativa positiva, mas houve falhas dos gestores públicos da época”, opinou.

Tribuna Popular

Uma das moradoras atingidas pelas obras do dique, Júlia dos Santos também fez uso da tribuna. A cidadã, que recentemente esteve reunida com a Comissão de Obras da Câmara, salientou o anseio de todos os vizinhos pela garantia de novas residências definitivas, rechaçando a inclusão em programas de aluguel social. “Não precisamos de migalhas. Todos nós trabalhamos e pagamos água, luz e taxa de coleta de lixo. Merecemos respeito”, afirmou Júlia, que relatou a falta de amparo da assistência social.

Nunca nos deram apoio. As crianças acordam de madrugada e perguntam: ‘a máquina vai vir e derrubar a nossa casa?’ Sinto essa dor de cada um. Estamos atirados e em depressão. As pessoas não conseguem dormir. Ninguém aguenta mais. Está na hora de nos olharem com carinho. Tiraram a nossa paz, a nossa saúde, tudo o que tínhamos. Queremos a nossa casa. Não somos culpados pelo que aconteceu com o dique. Estamos pedindo socorro”, continuou.

Líder do governo na Câmara, Giovani Caju disse ter estabelecido linha direta de diálogo com o prefeito Gustavo Finck sobre a temática do reassentamento. Ele foi muito enfático de que não quer mais o aluguel social em Novo Hamburgo. Depois de todo o trauma que essas famílias já passaram, fazer o deslocamento para uma casa temporária antes de uma definitiva é muito complicado. O pessoal já está fragilizado”, ponderou.

Também nos foi passada a informação de que, entre 18 e 24 meses, Novo Hamburgo deve receber cerca de 1,5 mil casas e apartamentos. Estamos conversando sobre como contemplar cada família com o menor impacto possível. As pessoas não podem ser tratadas como nomes em uma lista, porque cada caso tem sua particularidade”, reforçou Caju.

Ito Luciano propôs a criação de uma comissão parlamentar que busque soluções diretamente em Brasília. Já estamos há mais de dois meses tratando desse assunto e nada. Temos casas em que as máquinas já estão chegando perto. As pessoas não sabem mais a quem recorrer. Temos que buscar uma solução”, declarou.

Luciana Martins convidou todos os presentes para participarem de audiência pública convocada pela Comissão de Cidadania e Direitos Humanos da Assembleia Legislativa justamente sobre o reassentamento dos moradores do bairro Santo Afonso. O debate deve ocorrer no dia 15 de maio, a partir das 19h, no Plenário da Câmara de Novo Hamburgo.

O que é uma moção?

A Câmara se manifesta sobre determinados assuntos – aplaudindo ou repudiando ações, por exemplo – por meio de moções. Esses documentos são apreciados em votação única e, caso sejam aprovados, cópias são enviadas às pessoas envolvidas. Por exemplo, uma moção louvando a apresentação de um projeto determinado no Senado pode ser enviada ao autor da proposição e ao presidente daquela casa legislativa.