De vendedor de picolé a vereador: a trajetória do Despachante da Comunidade

por Tatiane Souza última modificação 18/04/2022 06h51
12/04/2022 – O Despachante da Comunidade, como se autointitulava Sergio Hanich ao ocupar a tribuna da Câmara, não tinha meias palavras. Era um vereador que, independentemente de estar na situação ou oposição, externava suas opiniões sem receio de ferir os brios de colegas de legenda ou de opositores. Por dois anos consecutivos (2018 e 2019), o parlamentar do MDB atuou como líder de governo. Atualmente, estava à frente da condução da bancada de seu partido, função desempenhada por ele cinco vezes nos últimos dez anos.
De vendedor de picolé a vereador: a trajetória do Despachante da Comunidade

Foto: Moris Mozart Musskopf/CMNH

“A política foi a faculdade que não fiz. Estou fazendo agora. Todo dia tu estudas uma matéria diferente. Sempre brinco: um dia tu ensinas, no outro, tu aprendes”, falou Serjão, em entrevista concedida à TV Câmara NH no programa Perfil Parlamentar, gravado no final de 2021.

O aprendizado não era resultado apenas de sua atuação no Legislativo, ambiente que vivenciou como titular de 2009 a 2022, por quatro mandatos consecutivos. O último deles foi interrompido abruptamente nesta segunda, 11, após um mal-estar tê-lo impedido de participar da sessão plenária e culminado em sua morte pouco tempo depois de sair da sede da Câmara.

Vendedor de picolés, subsecretário de Obras e vereador

Natural de Novo Hamburgo, ainda pequeno Serjão mudou-se para a localidade de Chuvisqueiro, pertencente ao município de Riozinho. Retornaria a solo hamburguense aos 12 anos. Dessa época, o parlamentar se recorda das principais vias de Canudos – Bartolomeu de Gusmão, Curitibanos, Ícaro e Oscar Horn –, ainda de chão batido, com acesso ruim e pouca infraestrutura. Essas dificuldades de locomoção provocadas pela falta de asfaltamento eram sentidas pelo vereador quando saía com um carrinho para vender pastel e picolé no Aeroclube, local de diversão para a comunidade aos domingos.

“Passa um filme na cabeça lembrar o que era há 50 anos e olhar o que é hoje, principalmente Canudos, que evoluiu muito”, afirmou.

Os problemas vivenciados pela comunidade do bairro o levaram para a política, como revelou na entrevista. “De 1996 a 2000, eu fiquei no PSB. Foi por ele que concorri a primeira vez e fui o mais votado do partido. Acho que até hoje ninguém bateu meu recorde”, disse. Na ocasião, o bom resultado nas urnas não foi suficiente para garantir a vaga como titular. “Fiquei em 15º. Nós éramos 21 (vereadores) e passamos para 14. Eu cheguei a assumir em 2000, mas aí como suplente”, acrescentou Serjão, que após deixar a sigla de estreia se filiaria ao MDB.

De 2005 a 2008, o vereador foi subsecretário de Obras de Canudos. “Ali começamos as regularizações fundiárias e melhorias como canalização, asfalto e gabião nos arroios. Hoje dá orgulho de chegar à Marisol e ver constituída aquela localidade. Se nós olharmos a Kipling, dá gosto de visitar os amigos que estão lá. O próprio Aeroclube, a Iguaçu e a Vila das Flores”, enumerou as realizações no período que compôs a pasta.

A experiência adquirida nessa época é comparada a uma pós-graduação. “Ali é que tu vês a realidade de um município, da comunidade. Tu começas a conhecer um orçamento de verdade. E tens outra visão como vereador, que quer tudo naquela hora; os 14 querem ao mesmo tempo. E quando tu estás lá dentro tu sabes que não dá para atender todos”, relembrou, sinalizando a importância de se estabelecer prioridades.

Dos 18 anos de trabalho no serviço público, tanto no Executivo quanto no Legislativo, Serjão lamentava não terem sido concluídas as melhorias na vila Getúlio Vargas. “É o meu sonho. Vou terminar este mandato, e nós vamos conseguir constituir aquela comunidade lá com as benfeitorias, porque está muito sofrido. Não dá para acreditar, no século 21, termos bairros como nós temos dentro da cidade”, lamentou durante a gravação.

Das situações que o revoltavam, surgiu a expressão “tem que gritar mais que um tigre esfaqueado”, assim como outras que consagraram seu jeito espontâneo e despojado. Sem discursos redigidos, o parlamentar lembrava frequentemente suas ligações com os eleitores que o escolheram. “Sempre digo que o meu patrão é a comunidade, é ela que paga meu salário, ela que me mantém aqui. Eu tenho que prestar o melhor de mim, do meu trabalho e do meu gabinete, para que esta comunidade não tenha decepção, como eu já tive com a política”, confessou.

Conforme ele, o medo de frustrar expectativas fez a candidatura à majoritária ser adiada. “Se existe uma coisa que nunca quis fazer na minha vida, é tirar a esperança das pessoas. E eu não me sentia preparado para carregar o Município e todas as demandas que havia. Hoje posso dizer que estou mais preparado. Não adianta tu ires lá só para deixar uma foto de que tu foste prefeito ou presidente da Câmara. O que deixa marca é dizerem: ‘me dá saudade do tempo que ele esteve aqui’", declarou.

Em vários momentos, o vereador do MDB deixava bem evidente em suas entrevistas e diálogos o orgulho que tinha de sua trajetória como motorista e de sua participação na criação do Sindicato dos Trabalhadores em Transporte Rodoviário de Novo Hamburgo, entre 1986 e 1987. “Eu comecei como motorista nos anos 80, foi a minha primeira profissão. Nunca imaginei nenhuma outra. Eu queria aquilo ali, e sou realizado. Trabalhei em empresas muito boas, com caminhão, com carreta e ônibus (Hamburguesa e Central)”, explicou. As conquistas obtidas como sindicalista eram elencadas uma a uma, mostrando a precariedade da prestação do serviço antes de ser instituído o órgão de classe. A melhoria da escala com horário de almoço e a divulgação das folgas com 48 horas de antecedência são alguns dos avanços obtidos pela categoria na época de sua gestão.

Na política, Serjão também disse ter alcançado a sensação de dever cumprido. “Eu fico muito feliz de a comunidade ter me escolhido e ter me dado esta oportunidade de ser vereador. Hoje eu posso dizer que eu deito e durmo descansado. Eu alcancei os meus objetivos. As principais coisas que deveriam ser feitas para a comunidade, eu consegui fazer”.

Sergio Hanich elegeu-se para a 18ª Legislatura com 2.517 votos. Em 2022, o vereador integrou as Comissões de Meio Ambiente (Comam), de Obras, Serviços Públicos e Mobilidade Urbana (Coosp) e também o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, todos no cargo de secretário. 

Em 2010, o parlamentar foi vice-presidente do Legislativo hamburguense, na Mesa Diretora formada pelo presidente Jesus Maciel (PTB) e pelos secretários Alex Rönnau (PT) e Volnei Campagnoni (PCdoB). Voltaria a compor a Mesa dez anos mais tarde, na função de segundo-secretário.

Saiba mais sobre o vereador Serjão.

Assista na íntegra ao Perfil Parlamentar:


Sergio Hanich - Serjão

registrado em: