Produtor cultural defende permanência de espaço ocupado há mais de 40 anos por escola de samba

por Daniele Silva última modificação 18/06/2025 21h02
18/06/2025 – Com 75 anos de história, a Sociedade Recreativa Aí Vêm os Marujos poderá perder o espaço que ocupa há mais de quatro décadas. Conforme notificação emitida pela Prefeitura, a entidade tem até o dia 28 de junho para desocupar o galpão localizado no Parque do Trabalhador, no bairro Primavera. A pedido da vereadora professora Luciana Martins (PT), o produtor cultural Fábio Lima ocupou a tribuna da Câmara para defender a permanência da segunda agremiação carnavalesca mais antiga de Novo Hamburgo.
Produtor cultural defende permanência de espaço ocupado há mais de 40 anos por escola de samba

Foto: Moris Musskopf/CMNH

Fábio, que já atuou como conselheiro de políticas culturais, relatou que, após uma reunião na Secretaria de Cultura e um contato posterior com a Prefeitura, foi informado de que não havia mais o que fazer, pois a decisão já tinha sido publicada no Diário Oficial.

Ao discursar na tribuna, mencionou a homenagem realizada durante a sessão e destacou a importância de ver um atelier de arte sendo reconhecido pelo Legislativo. “Isso mostra que a cultura é plural. Há pessoas que homenageiam a cultura e a arte e outras que querem tirar o direito de uma sociedade com mais de 75 anos de existência. Uma sociedade negra, que é a segunda mais antiga de Novo Hamburgo, simplesmente recebe, debaixo da sua porta, um documento dizendo que temos 30 dias para sair. São pessoas que não conhecem a história da escola de samba Aí Vêm os Marujos”, declarou, indignado.

Ele reconheceu as dificuldades enfrentadas pelo espaço cultural, especialmente após a pandemia, e lembrou que a entidade, sem fins lucrativos, atualmente não recebe nenhum recurso. O produtor fez um apelo aos vereadores para que considerem a comunidade do “Buraco do Raio”, que ajudou a construir a entidade, erguida em um galpão que antes era utilizado como celeiro pela Prefeitura. Segundo ele, o prédio, localizado em frente ao recém-inaugurado Ginásio Victor Hugo Körbes, sofreu um incêndio anos atrás e foi reconstruído pelos próprios integrantes da agremiação.

Fábio lembrou ainda dos votos de congratulações aprovados pela Câmara pelo trabalho realizado no carnaval hamburguense. “Não estamos falando de invasão; estamos falando de um direito adquirido há mais de 40 anos. Estamos falando de formar uma comunidade em seu entorno.” Para o carnavalesco, é possível que outras entidades também utilizem o espaço, mas, antes de tudo, é necessário diálogo.

Fundada em 8 de janeiro de 1951, a escola Os Marujos é, segundo ele, um espaço de negritude e resistência que, infelizmente, por falta de reconhecimento de sua história, está sendo prejudicado. “Falo aqui como marujense, como uma pessoa que se criou em meio à bateria. Alguém que saiu da vila e hoje é produtor cultural, graças ao carnaval.”

Além de uma profissão, afirmou, a escola de samba lhe proporcionou princípios de vida. Fabinho, como é conhecido, lembrou que o carnaval vai muito além do desfile. Outra dificuldade mencionada é o fato de que há mais de seis anos Novo Hamburgo não realiza um desfile oficial de carnaval.

Manifestação dos vereadores

O líder do governo, Giovani Caju (PP), informou que o Executivo está reavaliando todas as cessões de espaços públicos no município. “Quero deixar claro que não é nada contra a entidade Os Marujos, pontuou. Sobre parcerias com outras instituições, Caju disse ter conhecimento de que a Leme (Associação dos Lesados Medulares) gostaria de atuar em conjunto, o que poderia trazer incentivo financeiro para o espaço. Fábio relatou que, há cerca de dois meses, a matriarca dos Marujos, de 89 anos, foi procurada por uma pessoa de outra entidade, que teria menosprezado toda a história da agremiação. Caju reiterou a importância de parcerias entre entidades, pois acredita que podem trazer benefícios mútuos. Também reconheceu que a Prefeitura precisa aprimorar sua comunicação com a população, especialmente em casos como este.

Joelson de Araújo (Republicanos) questionou os projetos e ações sociais desenvolvidos pela entidade e o número de famílias atendidas. Para ele, o uso de um espaço público deve ter como contrapartida uma atuação social. Fábio respondeu que há cerca de 200 famílias no território e que são realizadas atividades para crianças, mas faltam registros e divulgação dessas ações. Relatou também as dificuldades para captação de recursos, especialmente para entidades ligadas ao carnaval.

Felipe Kuhn Braun (PSDB) ressaltou a relevância do carnaval, que representa uma parcela significativa da sociedade. “Reconheço a importância das sociedades carnavalescas e o que elas fazem todos os dias.” Salientou ainda que o investimento público no carnaval é baixo em relação ao retorno que oferece à sociedade. Como presidente da Comissão de Educação e Cultura, comprometeu-se a acompanhar a situação.

Juliano Souto (PL) afirmou que a Câmara é o espaço para debater temas relevantes para a população. Corroborou com o colega Giovani Caju que todas as ocupações de espaços públicos estão sendo reavaliadas. No entanto, garantiu que não cabe alegar perseguição a entidades negras, pois todas as instituições estão sendo notificadas.

O presidente da Câmara, Cristiano Coller (PP), confirmou que todas as cessões de espaços públicos estão sendo revisadas, com o objetivo de conhecer o trabalho das entidades que os ocupam.

 Ausente na sessão para acompanhar audiência pública na Prefeitura, Professora Luciana Martins apresentou o Requerimento nº 790/2025 de informações sobre a notificação. A matéria foi aprovada no expediente da sessão desta quarta e será encaminhada ao Executivo.