Prêmio Cultural Ernesto Frederico Scheffel reconhece personalidades que fortalecem a arte e identidade hamburguense

por Maíra Kiefer última modificação 13/10/2025 16h49
09/10/2025 – Em 2025, Ernesto Frederico Scheffel completaria 98 anos de vida. A data, celebrada em 8 de outubro, ganhou uma pincelada especial um dia depois, quando foi reconhecida a atuação de oito personalidades da arte de destaque de Novo Hamburgo. Em sessão solene, no Plenário da Câmara, elas receberam, nesta quinta-feira, 9, o Prêmio Cultural que leva o nome do artista multifacetado, natural de Campo Bom, mas que protegeu o Centro Histórico de Hamburgo Velho e sempre incentivou a preservação do espírito artístico como instrumento de transformação.
Prêmio Cultural Ernesto Frederico Scheffel reconhece personalidades que fortalecem a arte e identidade hamburguense

Crédito: Daniele Souza/CMNH

Em seu pronunciamento, o presidente do Legislativo, Cristiano Coller (PP), destacou que a premiação é um reconhecimento especial para quem mantém viva a cultura de Novo Hamburgo, por meio da arte, da tradição e da criatividade. “Em uma cidade que respira diversidade cultural, da música ao nativismo, do Carnaval às artes plásticas, da dança à literatura, valorizar seus protagonistas é fortalecer nossa identidade e nossa memória coletiva”, afirmou.

Ao ocupar a tribuna, o secretário de Cultura, Angelo Reinheimer, disse que passou boa parte de sua vida profissional ao lado de Scheffel. “Confesso que aprendi muito, muito mesmo, mas ele deixou muitas indagações. Scheffel foi essa alma complexa, afetuosa com a sua cidade e, principalmente, era uma pessoa disponível para entender outras pessoas. Era de uma família humilde, fruto do ensino público. Era essa grande personalidade que abraçou Novo Hamburgo e que foi por ela abraçada”, lembrou, destacando que ontem foi celebrado o Dia Municipal do Patrimônio Histórico e Cultural de Novo Hamburgo, por ter sido ele um dos maiores defensores da causa no município. “Ontem, nós entregamos dois tombamentos. A cidade está fazendo as pazes com o seu patrimônio histórico. Passamos muitos anos com tombamentos engavetados. Ele não é um ato administrativo, mas alavanca os processos de restauro por meio de leis de incentivo”, sintetizou. Pontuou aos escolhidos que o tamanho da honra pela premiação se comparava à responsabilidade de carregarem para sempre o nome do artista em suas próprias trajetórias.

Lia Scheffel, irmã do pintor, foi a terceira a se pronunciar. “Que cada um de vocês hoje contemplados se sinta abraçado por ele. Sigam fortalecidos de coragem, iniciativa, dedicação, sensibilidade e amor. Sigam seus sonhos e ações culturais possíveis”, falou.

Na sequência, o prefeito Gustavo Finck (PP) disse que é sempre uma gratidão voltar à Câmara, porque dela saiu o primeiro vereador-prefeito. Ele destacou que a honraria era fruto do trabalho da legislatura iniciada em 2020 para criar reconhecimentos de representatividade, mencionando o Prêmio Empresarial Júlio Redecker, a ser entregue no dia 14 de outubro. “Que essa premiação cultural tenha uma vida longa pela frente. Legislaturas vão passar, mas os homenageados que tiverem essa honraria vão ter essa lembrança, que simboliza o legado que vocês construíram na área”, disse. Ele salientou a importância dos tombamentos assinados no dia anterior e comunicou que a cidade terá a maior rua coberta do Rio Grande do Sul, e que o espaço abrigará eventos culturais.



Homenageados


– Margarida Marília da Silva, cantora e carnavalesca

Ao comentar o legado de sua escolhida, a vereadora Professora Luciana Martins (PT) afirmou que a cultura é o exercício pleno da democracia, que passa pelo direito de cidadania e de livre expressão e pensamento. Professora, cantora e carnavalesca, Margarida se dedicou por mais de 25 anos à docência na rede municipal de Novo Hamburgo, além de atuar na Escola de Artes. “Abriu portas para que crianças e jovens encontrassem a mesma potência que ecoa no samba: identidade, pertencimento e alegria de existir. Realizou diversos projetos e transformou currículo em palco para a cultura afro-brasileira, trazendo a história, a musicalidade, a beleza e a dignidade. Rainha, passista e cantora, tornou-se presença marcante no Carnaval hamburguense, conectando gerações em desfiles e eventos”, declarou, um pouco antes de iniciar a leitura de uma poesia de sua autoria para exaltar sua agraciada.

Colega de profissão, Margarida, após receber um certificado e o troféu, relatou que muitas vezes esteve na Fundação Scheffel com seus alunos e assistiu a concertos. Ela disse que trabalhar na Escola de Arte Carlão, na qual ensinava dança afro-brasileira, fez perceber a diversidade do município, que ofertava no mesmo local também aulas de balé. “A educação é que faz toda a diferença, mas a cultura é que me trouxe até aqui, porque eu vim para Novo Hamburgo na década de 1990, trazida pelo Carnaval. Como Rainha do Carnaval, me apaixonei pela cidade e fiz o concurso para ser professora do município. Durante 28 anos lecionei aqui”, relatou, comentando que os alunos eram instigados por sambas-enredos. “Através do samba que eu canto, eu também faço o meu protesto. Eu também levo a minha voz para que as pessoas saibam que, se o samba não morrer, não morre uma cultura que é negra, que é afro, que é minha, é de muitas pessoas dessa cidade. Ela foi construída por mãos de imigrantes alemães, mas teve a mão negra aqui”, declarou, clamando pelo canto de que o samba não morra em Novo Hamburgo.



– Billy Ânderson Batista Cassol, dançarino de breaking e cantor de beatbox

Cristiano Coller (PP) homenageou Billy Ânderson Batista Cassol, jovem autista que iniciou sua história na dança aos oito anos de idade. “Desde então, o que se viu foi a construção de uma caminhada marcada por coragem, autenticidade e uma incansável vontade de transformar a dor em expressão e o preconceito em potência criativa. Aos 16 anos, começou sua trajetória no beatbox”, elencou o parlamentar. O presidente da Câmara frisou que a trajetória de Billy vai muito além dos troféus. “Ele se tornou uma voz ativa pela inclusão das pessoas com autismo e neurodivergentes, utilizando sua arte como plataforma de transformação social”, disse, mencionando a participação do jovem no programa Caldeirão com Mion e no quadro Pode Perguntar, no Fantástico, da Rede Globo. “Hoje reconhecemos a força de uma história que inspira, que emociona e nos convoca a construir uma sociedade mais justa, mais inclusiva e mais humana.”

Ao agradecer a homenagem, com a voz embargada, Billy relatou que passou por diversas dificuldades durante toda a vida. “Já era hora de esse reconhecimento chegar. Foi um mérito que eu busquei. De todas as viagens que eu fiz pelo Brasil, de todas as coisas que tive que buscar para conseguir estar presente em vários eventos na minha área”, pontuou, dizendo que o ápice foi a participação no quadro A Arte Transforma, de Mion. Ainda contou aos presentes estar há mais de 12 anos na Escola Carlão estudando gravura e lamentou não ter tido a oportunidade de conhecer Scheffel.



– Derci Alves, patrão do CTG Essência da Tradição

Ico Heming (Podemos) exaltou o trabalho exercido por Derci Alves na preservação da cultura gaúcha. “Em 2022, assumiu o cargo de patrão do CTG Essência da Tradição, função que exerce com compromisso, estando atualmente em seu segundo mandato, sempre guiado pelo espírito gaúcho e pelo amor às tradições. A sua contribuição vai além das porteiras do CTG”, comentou. Para Ico, o exemplo de Derci inspira a todos e mostra que a tradição se constrói com trabalho, respeito e amor pelo Rio Grande. “Com tudo isso, esse prêmio é mais que merecido”, finalizou, parabenizando o homenageado por ser guardião da história.

Em seu pronunciamento, Derci Alves afirmou que conduzir a entidade como patrão não é um trabalho fácil. “Estamos há três anos trabalhando, cultivando a nossa cultura, mantendo o nosso CTG em pé. O Prêmio Scheffel é muito importante, e me sinto muito orgulhoso de receber essa premiação. Se não me engano, sou o primeiro patrão a ganhar essa distinção”, comentou.



– Eduardo Gomes da Silva “Tamborero”, músico integrante do grupo de rap Preconceito Zero

Enio Brizola (PT) contou que o grupo Preconceito Zero tem quase três décadas de trajetória, o que o motivou a conceder o Prêmio Ernesto Frederico Scheffel a Eduardo Gomes da Silva, o “Tamborero”. Formado em 1996, no bairro Santo Afonso, o grupo nasceu com um olhar voltado ao protagonismo das comunidades periféricas e negras, em uma cidade colonizada por alemães. “O hip-hop é o grito do povo, dando voz e visibilidade às expressões vindas da rua”, afirmou Brizola.

O parlamentar relatou que a atuação dos músicos não se restringe a Novo Hamburgo, onde ocorreram as nove edições do Festival Novo Hamburgo é o Alvo, mas representa uma militância estadual e nacional. “A música venceu. Parabéns, Preconceito Zero. Vida longa e com sucesso”, concluiu.

Em sua fala, Tamborero recordou o início do trabalho do grupo. “A gente tem uma trajetória no rap desde os anos 1990, quando, no Brasil, era uma música totalmente discriminada. E nós viemos, nessa caminhada, para que essa música e cultura, chamada hip-hop, fosse aceita — e ela foi, entre os jovens das periferias”, explicou.

Ele contou que ele e os demais integrantes vieram de um bairro discriminado, o Santo Afonso. “Quisemos que esse local fosse visto de forma diferente. A gente sempre diz que o Preconceito Zero é como um semáforo: está lá o sinal amarelo; só passa se quiser. A gente orienta o jovem para que não entre na criminalidade e na drogadição, que cuide da questão ambiental, da sua saúde física e mental, que possamos ter jovens saudáveis e críticos, que saibam reivindicar seus direitos e reconhecer seus deveres”, afirmou.

Tamborero reforçou que uma cidade sem cultura não tem identidade e tende a ser mais violenta. O homenageado anunciou que, em novembro, lançará um livro chamado Vidas Curtas, sobre a violência, com relatos de mães cujos filhos foram vítimas dessas situações. Contou ainda que seu parceiro de grupo, Mano Cascata — ao seu lado na tribuna —, também é autor do livro Ocupação, de poesias. “Nós estamos também incentivando o jovem a ler e a escrever”, acrescentou.

“Quando a gente montou o grupo, a gente só queria estar vivo. A gente via que os nossos jovens morriam cedo — e ainda morrem”, completou Cascata.



– Eunice Cristina da Silva Moser, tradicionalista

“A gente está muito feliz de poder, através das nossas mãos, te transmitir esse prêmio instituído nesta Casa Legislativa pelos teus relevantes trabalhos ao Movimento Tradicionalista Gaúcho”, disse Felipe Kuhn Braun (PSDB) à Eunice Cristina da Silva Moser, lembrando que essa dedicação ocorreu em paralelo à sua carreira profissional.

O parlamentar exaltou o exemplo de dedicação e compromisso da homenageada com as tradições gaúchas e o imenso amor dedicado por ela às raízes do povo rio-grandense. Ele mencionou ainda que, entre 2013 e 2018, ela foi diretora cultural da 30ª Região Tradicionalista — reconhecida como patrimônio histórico, cultural e imaterial de Novo Hamburgo —, presidida por seu esposo, Carlos Moser. Felipe apontou também que, em 2019, Eunice recebeu a Comenda João de Barro, homenagem concedida pelo Movimento Tradicionalista Gaúcho. “Que esse reconhecimento de hoje seja um incentivo para que sigas iluminando o caminho de tantos outros que, como você, acreditam na força da nossa tradição”, finalizou.

“Me sinto muito lisonjeada por essa homenagem que recebo na noite de hoje. Não tenho palavras, mas agradeço à Câmara e aos patrões dos CTGs de Novo Hamburgo pela indicação unânime. Ao longo da minha caminhada, pude contribuir com a parte cultural, que é a alma do tradicionalismo”, completou, salientando que é no CTG que as crianças aprendem o trabalho em grupo, a valorização de seus familiares e o verdadeiro sentimento de voluntariado.



– Pablo Geovani Jacoby, incentivador da cultura japonesa

“Meu querido homenageado, com muita alegria posso agraciá-lo com esse prêmio”, declarou Juliano Souto (PL) a Pablo Geovani Jacoby, mencionando a dedicação incansável do professor à preservação e difusão da cultura japonesa — especialmente pela forma singular com que soube integrar seus ensinamentos às realidades locais, levando-os a escolas, igrejas e espaços comunitários de Novo Hamburgo.

“Inspirado na filosofia dos samurais japoneses, Pablo encontrou no bushidô — o caminho da honra, disciplina e lealdade — um instrumento de formação humana e espiritual. Por meio de suas palestras e iniciativas culturais, tem revelado que os valores dessa tradição milenar dialogam de forma harmônica com os princípios cristãos da fé, do respeito e da convivência solidária”, acrescentou o parlamentar.

Juliano afirmou que o homenageado deixou uma marca profunda na gestão pública, tendo exercido o cargo de gerente da Secretaria Municipal de Cultura. “Em um tempo em que tantas vezes a cultura é colocada em segundo plano, Pablo nos lembra que o verdadeiro desenvolvimento de uma comunidade passa pela educação, pela arte e pela espiritualidade”, concluiu.

Pablo Geovani Jacoby iniciou sua fala destacando que tudo o que o ser humano faz é cultura. “Novo Hamburgo respira cultura desde o seu nascimento — suas praças, seus parques, as igrejas, templos e santuários, com sua iconografia, a arte abraçando a teologia”, ponderou, mencionando também a biblioteca, a Casa de Cultura, os museus e o arquivo público como tesouros da cidade.

Ao agradecer pela premiação, frisou a importância do artista que dá nome à honraria. “Em todo o continente americano, Scheffel é a única pessoa com obras expostas publicamente em Florença, na Itália”, afirmou.



– Paulo Moraes Trentin, músico nativista

Na abertura de sua fala, o vereador Giovani Caju (PP) elencou uma série de premiações recebidas pelo músico e compositor nativista Paulo Moraes Trentin, muitas delas no Festival Ronco do Bugio. “Ao longo de sua carreira, Paulinho vem consolidando um legado de respeito, amor e dedicação à música regionalista, fortalecendo o sentimento de identidade e pertencimento do povo gaúcho. Seu trabalho artístico eleva o nome de Novo Hamburgo e contribui significativamente para a difusão e valorização da cultura nativista.”

Paulinho, como é chamado, falou sobre a honra de ter sido indicado por Giovani Caju. Contou que o momento o remetia a uma situação vivida há duas décadas, quando começou a escrever. Natural de São Francisco de Paula, lembrou sua origem dentro do CTG. “Tudo o que eu escrevia era voltado ao lado tradicionalista, gauchesco. Para escrever melhor, eu tive que estudar. Quando tu encontras um tema, tens que fazer a composição baseada em realidades. Eu não sabia onde chegaria, pois estava escrevendo e as letras estavam lá, paradas. Mas um dia consegui chegar ao caminho dos festivais”, declarou, rememorando a primeira vitória em Campo Bom, em 2017, com a milonga Conquistando Fronteiras, e as conquistas em 2019 e 2025, em sua terra natal, São Francisco de Paula.



– Renato Luís Pereira dos Santos, músico e professor

Daia Hanich (MDB), filha do vereador Sergio Hanich – Serjão, falecido em 2022 e responsável pelo projeto que instituiu o dia 8 de outubro como o Dia Municipal da Preservação do Patrimônio Histórico e Cultural, foi a última a se pronunciar. Ela destacou que Renato Luís Pereira dos Santos, seu homenageado, dedicou sua vida à arte e à educação. Desde a adolescência, quando iniciou seus estudos musicais, segundo a parlamentar, ele trilhou um caminho brilhante, marcado pelo talento e comprometimento com a cultura.

Ao longo de sua carreira, destacou-se como saxofonista, atuando em diversas orquestras importantes do Estado: da PUC, da Ulbra, da UCS, do Sesi Fundarte de Montenegro e da Ospa, em Porto Alegre. Desde 1998, integra a Orquestra de Sopros de Novo Hamburgo, na qual atua como instrumentista e diretor executivo. É fundador do Barlavento, quarteto de saxofones, e diretor do Núcleo da Orquestra Jovem de Novo Hamburgo. “Sua contribuição ultrapassa os palcos, fortalece a cultura de Novo Hamburgo, inspira gerações e dá continuidade a um legado de valorização cultural.”

“É uma honra ser lembrado pelo trabalho que a gente faz. E essa noite a gente está aqui celebrando a cultura — e é sempre muito importante fazer isso. A cultura não pode ficar fora de nenhuma discussão que a gente desenvolve na sociedade, e aqui estamos em uma casa legislativa, que trabalha com a aprovação de leis. No dia 29, foi lançado um relatório global da Unesco sobre políticas culturais. O documento apontou o impacto econômico que a indústria cultural e criativa tem no mundo, correspondendo a 3,39% do PIB global e 3,55% de todos os empregos. O turismo cultural gerou 741 bilhões de dólares em 2023, e os gastos em cultura são de 418,56 dólares por pessoa na Europa e América do Norte, e de 10 dólares per capita na América Latina. A gente está muito atrás. Gostamos de chamá-los de primeiro mundo — e não é à toa, porque eles investem mais nas pessoas”, disse, pedindo que a sociedade fale mais sobre cultura e que premie e reconheça mais os profissionais da área.

Música e encerramento

Em um breve intervalo, a Orquestra Jovem de Novo Hamburgo — resultado de um projeto que fornece formação instrumental e prática de conjunto — apresentou a 9ª Sinfonia, de Beethoven. Ao término da homenagem, foi realizada a entrega de flores ao secretário Reinheimer e à Lia Scheffel, irmã de Ernesto Frederico Scheffel.

Clique e confira as imagens do álbum da premiação:

Prêmio Cultural Ernesto Frederico Scheffel 2025

 

 Assista à premiação na íntegra: