Prefeitura não renova decreto de calamidade financeira, mas contas ainda preocupam

por Luís Francisco Caselani última modificação 23/09/2025 18h38
23/09/2025 – Publicado em março, o decreto de calamidade financeira assinado pelo prefeito Gustavo Finck chegou ao fim na última semana. Após nova avaliação, o Executivo optou por não prorrogar sua vigência. O cenário, contudo, ainda não é animador. Em audiência pública convocada pela Comissão de Finanças da Câmara (Cofin) na manhã desta terça-feira, 23, a secretária municipal da Fazenda, Michele Antonello, explicou a necessidade da manutenção de medidas administrativas de contingenciamento de gastos. “Teremos, sim, de rever todos os nossos atos contratuais e eventuais novas contratações. Tudo deverá ser pensado com muita parcimônia. A situação segue muito séria e muito grave. Vamos encerrar o ano com déficit”, afirmou a secretária.
Prefeitura não renova decreto de calamidade financeira, mas contas ainda preocupam

Fotos: Pyetra Trindade/CMNH

A audiência pública, realizada no Plenário da Câmara, serviu para a avaliação do cumprimento das metas fiscais do Poder Executivo ao longo dos oito primeiros meses do ano. A atividade foi conduzida pelo presidente da Cofin, Enio Brizola (PT), e contou com a participação do relator do colegiado, Eliton Ávila (Podemos), do secretário, Ricardo Ritter – Ica (MDB), e dos também vereadores Ico Heming (Podemos) e Professora Luciana Martins (PT). O debate ocorreu entre as duas votações da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), que projeta para 2026 um desequilíbrio financeiro de mais de R$ 197 milhões. Aprovado por unanimidade na véspera da audiência, o projeto retorna à pauta durante a sessão desta quarta-feira, 24.

Aumento da receita

Os dados apresentados pela Secretaria da Fazenda (Semfaz) apontam uma receita realizada de R$ 1,22 bilhão entre janeiro e agosto, um crescimento de 11,1% em relação ao mesmo período do ano passado. O montante equivale a 61,1% do valor estimado para todo o exercício de 2025, fixado em pouco mais de R$ 2 bilhões. Cifra que, segundo Michele, não deve ser atingida. “Para justificar o que foi previsto, precisaríamos arrecadar R$ 800 milhões em quatro meses. E é essa situação que queremos apresentar. Não há como haver um equilíbrio financeiro com uma expectativa que não se realiza”, pontuou a secretária, que criticou os valores superestimados. “Não há um compasso entre a arrecadação e os contratos já firmados e em execução pelo Município”, lamentou.

Para os próximos anos, Michele garantiu a apresentação de orçamentos mais condizentes com a realidade hamburguense. “A nossa expectativa para 2026 é trazer uma frustração de receita bem menor”, informou a gestora, que reiterou os esforços da Prefeitura para ampliar a obtenção de recursos sem onerar o contribuinte com o aumento da carga tributária. “E, ao mesmo tempo, um gerenciamento das despesas sem cortes nas atividades-fim. Esse é o equilíbrio que estamos buscando”, resumiu.

O contador Valdelino de Abreu, que se somou à secretária na exposição dos relatórios de gestão fiscal e execução orçamentária, repetiu aos vereadores que a previsão de R$ 2 bilhões não será alcançada, mesmo com variáveis eventualmente favoráveis. “Mas as despesas, se deixadas por conta, chegariam. Por isso procuramos fazer esses cortes de gastos, para realmente tentarmos equalizar”, reforçou. Até o final de agosto, as despesas liquidadas permaneciam próximas a R$ 1 bilhão, resultando em um superávit parcial de R$ 217,4 milhões.

Restos a pagar

O principal motivo que levou o prefeito a decretar estado de calamidade financeira foi o volume de obrigações deixadas pela antiga gestão sem a devida disponibilidade em caixa. Essa insuficiência deixou um saldo a ser pago de mais de R$ 202,6 milhões. Desse valor, R$ 112,5 milhões já foram quitados pelo atual governo. “Por incrível que pareça, ainda estamos mensurando esse valor deficitário. Semana passada, por exemplo, recebemos mais processos de 2024 sem empenho. Então ainda estamos apurando. A cada mês tem uma surpresa”, revelou Michele.

Apesar dos esforços em pagar os valores devidos, a secretária ressaltou que o processo deve se estender ao longo da gestão. “Isso não será resolvido em um ano, porque também temos que pensar no fim, na entrega de serviços ao contribuinte. É um trabalho feito com muita austeridade e zelo para que ninguém seja prejudicado. E sempre dentro dos parâmetros da lei”, assegurou.

Dívida recua

Assim como na prestação de contas de maio, a Prefeitura comemorou a diminuição da dívida consolidada líquida, que caiu de R$ 754,1 milhões em abril para R$ 705,9 milhões no final de agosto. Um recuo de 6,4%. Na comparação com dezembro (R$ 951,5 milhões), a queda é ainda mais acentuada: 25,8%. O volume da dívida, contudo, ainda assusta o vereador Enio Brizola. Embora dentro dos percentuais legais, o grande gargalo do Município é esse superendividamento. É um debate que precisamos fazer com muita coragem e transparência. Isso é determinante para o futuro da nossa cidade”, opinou o presidente da Cofin.

Saúde e educação

Os relatórios produzidos pela Semfaz também detalharam os recursos destinados às áreas de saúde e educação. Os investimentos em ações e serviços públicos de saúde alcançaram R$ 121,2 milhões, o que equivale a 22,3% da receita resultante de impostos e transferências constitucionais, acima dos 15% previstos pela carta magna brasileira. Dentro dessa mesma fatia de arrecadação, um quarto deve ser direcionado à manutenção e desenvolvimento do ensino. No entanto, até o final de agosto, o percentual permanecia abaixo (15,5%), com os investimentos na casa de R$ 85,4 milhões.

A secretária da Fazenda reforçou que, assim como em exercícios anteriores, o índice de 25% deve ser atingido até o final do ano. Professora Luciana Martins, entretanto, salientou a importância de os investimentos serem diluídos ao longo do exercício. “Esse valor que não estamos aplicando nos dois primeiros quadrimestres traz prejuízos lá na ponta, para quem está fazendo a educação”, declarou.

Folha salarial

Já a despesa total com pessoal entre setembro de 2024 e agosto de 2025 foi de R$ 413,4 milhões, o que corresponde a 28,8% da receita corrente líquida do período, apurada em mais de R$ 1,4 bilhão. O percentual segue inferior ao limite para emissão de alerta, estabelecido em 48,6%. Os números chamaram a atenção de Luciana Martins, que avaliou o espaço na folha salarial como um retrato da perda de poder aquisitivo por parte dos servidores e da falta de pessoal em diversos setores do funcionalismo.

Transparência

A Prefeitura garante que todas as informações, assim como maiores detalhamentos, podem ser encontradas no Portal da Transparência. A prestação de contas quadrimestral é prevista pela Lei Complementar Federal nº 101/2000, que estrutura a fiscalização e o controle dos gastos de estados e municípios, além de promover a transparência das finanças públicas.

Assista à audiência pública na íntegra: