Integrante do Coletivo Feminista Desperta defende a descriminalização do aborto

por Tatiane Souza última modificação 15/08/2018 14h53
13/08/2018 – A integrante do Coletivo Feminista Desperta, Caroline Luiza Willig, usou a tribuna na noite desta segunda-feira, 13, para contrapor a Moção nº 21/2018, de autoria do presidente da Casa, Felipe Kuhn Braum, que manifestou repúdio a descriminalização do aborto. “Nossa principal luta é pelo fim da violência contra a mulher”, disse a ativista, ao defender que a pauta é feminina.
Integrante do Coletivo Feminista Desperta defende a descriminalização do aborto

Foto: Daniele Souza/CMNH

Caroline leu, na íntegra, o seguinte documento:

Manifesta Repúdio à moção de repúdio sobre a ação que pede a descriminalização do aborto. 

O artigo 5º da Constituição Federal, citado na moção de repúdio feita pelo Vereador Felipe Kuhn Braun em nome da comunidade católica à ação que pede a descriminalização do aborto até os três meses de gestação, fala que “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade […]”. Neste contexto, cercear os direitos da mulher sobre seu próprio corpo acaba, por, violar o seu direito à vida, à liberdade, igualdade, segurança e propriedade. E o fazer em nome do catolicismo é mais um afronte, visto que o estado brasileiro é laico.

É cientificamente comprovado que o feto só se transforma numa pessoa quando começa a produzir ondas cerebrais semelhantes às de um ser humano “pronto”, e isso ocorre após o terceiro mês de gestação – a vida de uma mulher vale, então, menos que a de um feto que nem sente? Assim sendo, aborto legal é questão de saúde pública, e não oferecer este serviço e ainda punir com três anos de cadeia mulheres que abortam é uma violação de seu direito à vida, pois elas acabam recorrendo a métodos não seguros que as matam ou, acabam internadas em hospitais públicos após procedimentos malfeitos em clínicas clandestinas, resultando em uma conta assombrosa para toda a população brasileira.

Relevante ressaltar que, de acordo com a Organização Mundial de Saúde, países com leis que proíbem o aborto não conseguiram evitar a prática e que contam atualmente com taxas maiores do que nos países em que o aborto é legalizado. Isso ocorre porque a descriminalização é acompanhada de uma estratégia séria de planejamento familiar e acompanhamento psiquiátrico. Exemplo disso são as pesquisas atestam que a cada minuto, ocorre um aborto no Brasil, sendo ele legalizado ou não. A diferença, é que as mulheres ricas conseguem abortar, e as pobres morrem tentando.

A cada dois dias, morre uma mulher tentando abortar no Brasil. Uma pesquisa realizada pela UnB (Universidade de Brasília) apontou que entre 70,8% e 90,5% das mulheres que praticam o aborto no Brasil já têm outros filhos e fazem uso de métodos contraceptivos regularmente – o que reforça a tese de que o aborto seria medida de planejamento reprodutivo – empregado em último caso, quando os outros métodos contraceptivos falharam. Uma em cada cinco mulheres aos 40 anos já fez, pelo menos, um aborto – isso significa que 4,7 milhões de mulheres já abortaram. 88% delas se declara católica, evangélica, protestante, ou espírita. Elas sabem o que é a maternidade, pois a grande maioria já possui filhos – não são mães de primeira viagem e sabem muito bem que ter filhos não é simplesmente gestar e parir uma criança, segundo a Pesquisa Nacional do Aborto 2016 realizada pela Anis – Instituto de Bioética e Universidade de Brasília, financiada pelo Ministério da Saúde.

Não há nada de admirável em defender o nascimento de uma criança indesejada, que chegará ao mundo sem estrutura ou condições, e que com a falta de políticas públicas brasileiras, já nasce fazendo parte de uma parcela da sociedade que tem acesso a uma quantidade mínima de direitos. Se esta criança, pelo seu histórico de privações, sucumbir ao crime, este mesmo conservador pró-vida dirá que “bandido bom é bandido morto”. Querer que a criança nasça sem se importar com o tipo de vida que ela terá não é ser pró-vida, é ser pró-nascimento.

Outro dado relevante é a questão do aborto paterno, que é comum no Brasil: mais de cinco milhões de crianças não têm o nome do pai no registro de nascimento, sem falar nos “pais de papel”, que registram os filhos e seguem suas vidas como se nada tivesse acontecido, mas quando a questão da descriminalização é levantada, brotam homens de todos os lugares opinando sobre o que não lhes diz respeito. Sem útero, sem opiniões.

Diante disso, requer-se, após os trâmites regimentais, que seja enviada cópia da presente Moção de Repúdio ao Supremo Tribunal Federal. 

Novo Hamburgo, 13 de agosto de 2018.