Evento defende a construção de políticas públicas para prevenção e resposta a desastres
O evento é uma construção coletiva entre a Escola do Legislativo de Novo Hamburgo, a Associação Brasileira das Escolas do Legislativo e de Contas (Abel), a Associação Brasileira de Empresas de Componentes para Couro, Calçados e Artefatos (Assintecal), a Cooperativa de Trabalho e Renda Univale, a Escola do Legislativo de Uruguaiana, a Faculdade IENH, a Ftec Faculdades, o Instituto de Estudos em Governança e Gestão na Administração Pública (Ieggap), o Movimento Nacional ODS Rio Grande do Sul e o Tribunal de Contas do Estado (TCE/RS).
Em discurso de abertura, a diretora da Escola do Legislativo hamburguense, Maria Carolina Seitenfus Hagen, explicou como surgiu a parceria entre as diferentes instituições e como o grupo tem trabalhado a Agenda 2030, compromisso global firmado pelos países membros da ONU com foco no desenvolvimento sustentável. O tema específico dos debates desta quinta-feira já era planejado desde o início do ano, mas ganhou ainda mais força após a tragédia climática de maio. “Tivemos 876 mil pessoas atingidas diretamente pelas enchentes e deslizamentos, um total de 8,8% dos domicílios de todo o estado”, mensurou Maria Carolina.
Políticas públicas municipais
Conduzido pelo advogado Lucas do Nascimento, presidente do Ieggap, o primeiro painel do dia abordou as obrigações legais envolvidas na concepção de políticas públicas de prevenção e enfrentamento às mudanças climáticas. “É um tema que se mostra de relevância crescente, mas que já possui destacada importância há muito tempo, infelizmente sem a devida atenção”, iniciou o moderador.
Advogada, consultora e especialista em gestão de riscos e desastres, Fernanda Damacena falou sobre a urgência de os órgãos públicos investirem em estrutura, capacitação e profissionalização. “Quando pensamos em prevenção, estamos falando de um conjunto de medidas voltadas à redução de vulnerabilidades. O município precisa reconhecer todas as suas capacidades e necessidades. Não conseguimos desenvolver uma ideia de política pública se não estivermos atentos a isso. O primeiro passo é o diagnóstico. E diagnóstico não é ‘achômetro’. Tem que partir de conhecimento técnico, científico e especializado”, resumiu.
Fernanda também enfatizou o dever de atuar mesmo antes de alertas climáticos e comentou sobre o papel da iniciativa privada no processo. “É muito importante inserir, no exercício da atividade econômica, o gerenciamento de riscos e desastres com muita atenção. Olhar para o seu empreendimento e ver de que forma ele pode afetar a comunidade”, afirmou.
Coordenador da Defesa Civil de Montenegro, Clóvis Pereira utilizou sua experiência pessoal no comando da pasta para frisar a necessidade de atualização constante dos planos de contingência para agilizar a resposta a desastres. “Entre junho do ano passado e junho deste ano, tivemos 15 enchentes na nossa cidade. Aperfeiçoamos nosso plano de contingência nove vezes nesse período, porque cada evento é diferente. Como disse Fernanda, devemos ter o gerenciamento antecipado da situação de crise. Tudo é questão de planejamento. Não temos tempo para pensar e para errar”, avaliou Pereira, que reiterou a importância também da articulação de ações junto a municípios vizinhos para antecipar ocorrências.
O defensor público Rafael Magagnin esclareceu o papel de seus colegas após o desastre climático de maio e sublinhou a importância do trabalho de reassentamento das famílias que se encontram em locais de risco. “É uma tarefa extremamente dificultosa, porque dialogamos não apenas com a questão da segurança; temos o lado do trabalho, da cultura e dos vínculos sociais. Nosso desafio é conseguir chegar às pessoas e conscientizá-las, para que evitemos uma maior exposição aos riscos. Em paralelo a isso, também precisamos orientar o poder público para a criação de políticas de enfrentamento, como o oferecimento de locais seguros onde as famílias possam continuar exercendo suas atividades dentro de um mesmo seio social”, contextualizou.
Presente ao evento, o relator da Comissão de Meio Ambiente da Câmara de Novo Hamburgo, Enio Brizola (PT), falou sobre a precariedade da Defesa Civil local. “Esse episódio também revelou um negacionismo ambiental, tanto por parte dos gestores públicos quanto por parte da população, contaminada todos os dias com cargas de desinformação e que passam a desconsiderar os avisos climáticos. Foi isso que levou moradores, especialmente do bairro Santo Afonso, a retardarem sua saída. Toda essa questão dos riscos, desastres e prevenção é transversalizada. Este é o momento de incluir as pautas ambientais nos planos de governo dos próximos prefeitos”, ressaltou o vereador.
Catadores
O segundo painel da manhã teve início com a fala da coordenadora de Mobilização Adjunta do Movimento Nacional ODS Rio Grande do Sul, Daiana Schwengber. Bióloga e pesquisadora, ela fez um resgate histórico sobre a introdução do papel do catador em sociedades antigas e sua presença contínua até os dias atuais, mesmo que sob um manto de invisibilidade. “Hoje, o trabalho ainda é feito de maneira precarizada. Mais de 90% dos catadores não estão organizados. São mais de 1 milhão de profissionais”, informou Daiana, que enalteceu o trabalho das cooperativas e defendeu que o serviço prestado seja remunerado, independentemente da venda dos materiais triados.
“Hoje, 90% da reciclagem no Brasil é feita por catadores. Mas as pessoas que triam recebem apenas se vendem. Esse trabalho precisa ser pago. É um serviço de saúde pública, saneamento e cuidado com o meio ambiente. Por que empresas privadas recebem valores tão grandiosos quando entram em uma cidade e cooperativas precisam brigar tanto para não perder seus contratos?”, questionou a painelista, que também traçou um paralelo entre saneamento e saúde. “Se não trabalhamos com prevenção em saneamento, gastamos sete vezes mais depois”, estimou.
Presidente da Cooperativa Univale, Alessandro Alves explicou que a associação de catadores permite que pessoas saiam de situações de vulnerabilidade e acessem o mercado de trabalho. “Hoje sou apaixonado pelo que faço, mas me tornei catador por necessidade. Nós, enquanto cooperativa, só conseguimos avançar devido ao apoio do poder público. Esse é também o grande problema que enfrentamos. Se eles não quiserem, não acontece. E catador não vive de resíduo, porque não paga a conta”, lamentou.
Diretora de Limpeza Urbana da Prefeitura, Cristiane Hermann disse não conseguir mais enxergar a coleta seletiva na cidade sem a operacionalização das cooperativas. “Nós temos resultados quando trabalhamos com os catadores. E não devemos achar que o contrato é uma ajuda de custo. Estamos pagando por um serviço prestado. Existem metas e existem cláusulas a serem cumpridas”, reforçou Cristiane, que também agradeceu o apoio dos catadores durante o estado de calamidade provocado pelas enchentes. “Eles foram fundamentais, nos ajudaram em todas as frentes. Houve uma parceria muito grande”, revelou. O painel contou com a moderação de Rossana Parizotto Ribeiro, coordenadora-geral do Movimento ODS.
Troca solidária
Durante o evento, o público que acompanha presencialmente a atividade pôde participar de uma proposta de troca solidária. Convidadas a trazerem resíduos potencialmente recicláveis, como óleo de cozinha usado, esponjas, latas e embalagens, as pessoas poderão levar para suas casas mudas de chás, temperos e plantas ornamentais. A iniciativa teve o apoio do Centro de Educação Ambiental Ernest Sarlet, espaço pedagógico mantido pela Prefeitura no bairro Lomba Grande.
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Assista na íntegra aos dois primeiros painéis: