Comissão debate questões técnicas sobre instituição do Programa Família Acolhedora

por Luís Francisco Caselani última modificação 08/11/2018 20h38
08/11/2018 – A Comissão de Constituição, Justiça e Redação (Cojur) da Câmara tem analisado desde agosto projeto de lei do Executivo que propõe a criação do Programa Família Acolhedora, instituindo a modalidade de guarda subsidiada de crianças e adolescentes afastados temporariamente de suas famílias de origem. Nesta quarta-feira, 7 de novembro, o grupo parlamentar reuniu-se com o que virá a ser o braço executor da iniciativa, bem com órgãos diretamente ligados à temática. Durante o encontro, os vereadores expuseram dúvidas quanto ao projeto e apontaram trechos nos quais identificaram inconsistências.
Comissão debate questões técnicas sobre instituição do Programa Família Acolhedora

Fotos: Anderson Huber/CMNH

A presidente da comissão, Patricia Beck (PPS), deixou claro que o objetivo da reunião era contribuir para o aprimoramento da redação da matéria. “Não somos contrários à ideia, mas há algumas questões técnicas para debatermos. A nossa intenção é deixar o projeto o mais claro possível”, explicou. A vereadora destacou que o PL nº 63/2018 indica a criação de uma equipe técnica para acompanhar o acolhimento, mas não detalha como ela será montada. Patricia também grifou alguns dispositivos que levantaram um entendimento dúbio, como a ausência de especificação sobre quais e quantos integrantes do grupo familiar precisam ter idade entre 21 e 70 anos, para que estejam aptos a integrarem o programa.

Ela questionou ainda a razão da retirada, a partir de mensagem retificativa remetida pelo próprio Executivo, do apoio das varas de Infância e Juventude da Defensoria Pública, Juizado e Ministério Público no processo de seleção das famílias. A gerente de Proteção Social Especial de Alta Complexidade, Anete da Cunha, contou que um grupo de trabalho da Secretaria de Desenvolvimento Social (SDS) tem trabalhado na construção de um projeto técnico, previsto pela matéria legislativa, que detalha melhor a organização do programa e responde muitas das perguntas apresentadas. “É importante que não haja brecha na lei”, lembrou a advogada Michelly Schuman, representante da Subseção Novo Hamburgo da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/NH).

Os parlamentares questionaram se não seria possível que a Prefeitura anexasse ao projeto de lei o documento que vem sendo elaborado, esclarecendo a extensão do que irá a votação em plenário. Anete, que liderou a comitiva de servidores do Executivo presentes à reunião, solicitou que todas as dúvidas fossem encaminhadas pela comissão e, caso ainda não estejam contempladas, serão acrescentados dispositivos ao projeto técnico respondendo-as. A gerente garantiu ainda que a Prefeitura encaminhará o anexo até o final da próxima semana. Uma nova reunião será realizada no dia 19, a partir das 14 horas, também no Palácio 5 de Abril, para a equação das situações apresentadas e, se necessário, a redação de emendas adequando o texto.

Família Acolhedora

O objetivo do programa é garantir amparo e proporcionar meios de readaptação ao convívio em sociedade após casos de abandono, negligência, falecimento, ameaça e violação de direitos por parte de seus pais ou responsável, suspensão ou destituição de guarda, tutela e poder familiar ou ainda de afastamento cautelar. Para isso, os jovens seriam vinculados a famílias acolhedoras, cadastradas e capacitadas pela SDS, com possibilidades futuras de reintegração a suas famílias ou adoção. As famílias acolhedoras deverão residir em Novo Hamburgo há, pelo menos, dois anos, terem idade entre 21 e 70 anos, apresentarem idoneidade moral e não responderem a processo judicial.

O acompanhamento dos familiares cadastrados ocorrerá por meio de orientação direta, participação obrigatória em encontros de estudo, troca de experiências, cursos e eventos de formação, bem como visitas periódicas da equipe técnica do programa, composta por assistentes sociais e psicólogos. A família acolhedora, que assinará termo de guarda, ficará responsável pela assistência material, moral e educacional dos jovens, conforme preconiza o Estatuto da Criança e do Adolescente. Além do suporte técnico, cada família receberá um salário-mínimo mensal por jovem acolhido – até o teto de três salários. Em caso de pessoa com deficiência ou demanda específica de saúde, o valor poderá ser acrescido em uma terça parte.

O relator da Cojur, Raul Cassel (MDB), expôs preocupação quanto às famílias usarem o programa como fonte de recursos. Anete tranquilizou que o projeto técnico prevê renda mensal mínima para que o núcleo esteja apto a receber uma criança. O vereador questionou também sobre os danos que a quebra de um novo vínculo, a partir da conclusão do período de acolhimento, pode ter na construção social da criança. A psicóloga da SDS Denise Sardi afirmou que, em cidades que já consolidaram o programa, tem se constatado uma melhor adaptação das crianças, seja na família de origem ou através de uma adoção definitiva. “Nossa maior preocupação é uma estimulação mais individualizada. É melhor que o bebê ou a criança se vincule a uma pessoa com quem poderá criar vínculo de apego, segurança”, completou Anete.

Representantes do Conselho Tutelar e do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA) criticaram não terem sido convidados a participar da composição do projeto de lei, mesmo sendo incumbidos da fiscalização do programa. “Tomamos conhecimento da matéria, mas nunca participamos dos processos de construção, o que é um erro. O CMDCA vai ter que fazer o registro, mas não fomos convidados a participar da elaboração”, expôs a presidente do órgão, Márcia Glaser. Antes da nova reunião da Cojur, os vereadores devem se reunir na próxima quarta-feira, dia 14, com a juíza da Vara da Infância e da Juventude, Ângela Martini, para discutir a extensão do projeto.

Pacientes com câncer

Na segunda-feira, dia 5, a Cojur já havia se reunido para a análise de cinco proposições. A presidente Patricia Beck, o relator Raul Cassel e o secretário Cristiano Coller (Rede) receberam o vereador Fernando Lourenço (SD), convidado a discutir sobre o PL nº 33/2018, de sua autoria, que cria o Programa de Acolhimento a Pacientes com Diagnóstico de Câncer e seus Familiares. O motivo foram a respeito da juridicidade e aplicação de alguns dos dispositivos da matéria.

Fernando explicou que a proposta não deve gerar grande mobilização financeira e de pessoal por parte da Prefeitura. O programa funcionaria por meio de acompanhamento psicológico, terapias em grupo e orientação de equipes multidisciplinares visando a melhor aceitação da notícia por todos os envolvidos. “Já existem órgãos que poderiam dar esse auxílio, profissionais que podem ser utilizados para amparar e gerar esse acolhimento que favoreceria bastante os pacientes”, defendeu.

Cassel alegou que o texto não deixa claro quem deve assumir a obrigação e utiliza termos autorizativos para elencar possíveis postos de atendimento aos pacientes, como os Centros de Referência de Assistência Social (Cras) e de Atenção Psicossocial (Caps). Patricia alertou que é preciso deixar claro que não se está criando uma nova atribuição, uma vez que os órgãos já teriam essa incumbência. A presidente sugeriu ainda a exclusão dos Cras entre os locais de atendimento, uma vez que o acolhimento se encaixaria melhor aos Caps e outros serviços correlatos. A comissão e o parlamentar proponente concordaram em compor emendas para adequar a proposição.

Lei Orgânica

Os integrantes da Cojur também voltaram a apreciar o Projeto de Lei Orgânica Municipal nº 1/2018, que propõe a revisão total da que é considerada a Constituição do Município. Os parlamentares apontaram algumas incongruências ao longo dos 87 artigos que compõem a matéria. Em função disso, a proposição permanecerá em análise da comissão, que pretende elaborar emendas a fim de tornar o texto mais completo e preciso, dentro das necessidades e peculiaridades de Novo Hamburgo.

A Cojur ainda aprovou emenda apresentada por Raul Cassel a projeto de sua própria autoria – acatada em plenário em dois turnos e encaminhou dois vetos para votação em plenário, ainda que anexando parecer atestando a constitucionalidade do projeto e recomendando a rejeição ao impeditivo pretendido pela prefeita Fátima Daudt. O primeiro refere-se ao PL nº 35/2018, que estabelece diretrizes para a instalação de bocas de lobo em Novo Hamburgo. Já o segundo tem como objeto o PL nº 42/2018, que cria a Política Municipal de Incentivo ao Uso de Energia Solar, determinando a instalação de painéis solares em prédios públicos. De acordo com a argumentação da Prefeitura, os projetos violariam as normas constitucionais de independência e harmonia dos poderes, extrapolando a competência parlamentar. Os vetos serão analisados em plenário em única votação, deixando de prevalecer apenas com o voto de, no mínimo, oito vereadores.

O que são as comissões?

A Câmara conta com oito comissões permanentes, cada uma composta por três vereadores. Essas comissões analisam as proposições que tramitam pelo Legislativo. Também promovem estudos, pesquisas e investigações sobre temas de interesse público. A Lei Orgânica Municipal assegura aos representantes de entidades da sociedade civil o direito de participar das reuniões das comissões da Casa, podendo questionar seus integrantes. A Cojur se reúne às segundas-feiras, a partir das 17 horas, na sala Sandra Hack, no quarto andar do Palácio 5 de Abril.